É inegável a evolução a que assistimos nos últimos anos nos carros elétricos que circulam nas ruas. A Fórmula E acaba por estar na linha da frente para a evolução da tecnologia. É o suficiente para fazer aumentar o interesse em competições dessas?
É difícil perceber quando estamos a ser ultrapassados pelos novos tempos. Digo isto do alto da minha juventude, o que, no fundo, só reforça o ponto.
Esta ideia começou a formar-se com as declarações de Jean-Éric Vergne: “Os mais novos estão atentos à Fórmula E e acham que os veículos elétricos são cool”. Eu não consigo encontrar uma tradução adequada para cool e se calhar isso já faz de mim também um pouco mais velha do que esperava.
A reação a tal declaração nas redes sociais foi instantânea e pendia para a discordância radical, diria. Mas não partiu dos “mais novos” a quem o colega de equipa de António Félix da Costa se referia. Já lá vamos.
Usar a competição como campo de teste sempre aconteceu. Continua a acontecer também com os motores a combustão e não só nos circuitos alcatroados. E, como era de esperar, a tradição repete-se na competição com automóveis elétricos.
As marcas envolvidas na Fórmula E não têm pudor (e fazem até disso bandeira nas suas apresentações e criações) em dizer que usam muito do conhecimento adquirido com os pilotos e com as equipas na produção de soluções electrificadas: elétricas e híbridas. Essa é uma noção óbvia: a de que competições como a Fórmula E ou Extreme E querem-se na linha da frente para a transição energética.
Esse passo está dado e é necessário. Tal como também é urgente que estas competições sejam transparentes. Se o ambiente é um dos argumentos para a venda, tem também de ser o centro das decisões, começando pela preparação logística.
No que diz respeito ao desporto, faltam temperos. Não sei se o público da Fórmula E e da Fórmula 1 será sempre diferente. Podemos esperar uma fusão da Fórmula E com a Fórmula 1? Ninguém sabe ao certo. Para já seguem dois campeonatos distintos – e bem – e há a certeza de que a Fórmula E tem mais do que espaço para evoluir.
Desde 2014, aumentou o número de construtores, o número de corridas, mais eficiência, potência, rapidez e novas baterias, que permitiram o fim da troca de carro a meio da corrida, por exemplo. Já (muito) atrasado, vai o Extreme E, na segunda temporada. Com nomes sonantes envolvidos como o de Carlos Sainz e Nasser Al-Attiyah, é possível que a ambição seja grande. Espero que a exigência das marcas envolvidas também o seja.
Não me interpretem mal. O jogo é inevitavelmente diferente. E a necessidade de recorrer a novidades como o “Attack Mode” e o “Fan boost” pode ser desmotivadora. Mas numa altura de inovação, prefiro sublinhar a possibilidade de trazer novos desafios e aumentar a participação do público. Talvez mais novo, talvez mais digital, talvez também virado para os eSports e para o Sim racing, mas isso são outros quinhentos.
Em pista, o grande desafio apresenta-se logo pela gestão de energia. E já vimos António Félix da Costa, por exemplo, perder a liderança por erros de cálculo. O carro fica pelo caminho, há reviravoltas (no decorrer da corrida), e estratégia a ser melhorada.
Se o público não for, de facto, o mesmo que o da Fórmula 1, não resisto a relembrar (quase em tom de provocação) a desclassificação de Vettel no GP da Hungria em 2021, precisamente por causa do nível de gasolina abaixo do exigido pelo regulamento. E, indo mais longe, a perda do 2º lugar para Lewis Hamilton e (mais uma) subida ao pódio fora de horas de Carlos Sainz (o filho) também não encheram, certamente, as medidas a quem gosta de ver mais ação na pista e menos fora dela.
Regressando ao modo elétrico, a evolução já deu provas de vida nos últimos anos. E isso permite que o embate da saída da Audi, BMW e Mercedes da Fórmula E seja menor. O campeonato sente o murro no estômago, questiona-se a relevância e o retorno para as marcas, mas não se pode ignorar que são saídas de um campeonato que continua a ter mais construtores do que a Fórmula 1 e Le Mans, para onde, aliás, essas marcas apontam e onde já se corre em híbridos. Já falámos do passo seguinte: o desenvolvimento de tecnologia para as versões de estrada, e que reforça a noção de que não é descabido o desporto electrificado.
Que me perdoem os petrolheads, mas a evolução que nos espera nos veículos elétricos é entusiasmante. E esse caminho – feito em pista em competições que podem não entusiasmar todos – não tira o mérito e a alegria que os motores a combustão nos deram e continuam a dar.