No Dia Internacional do Enfermeiro, a ministra da Saúde foi ao hospital Santa Maria, em Lisboa. Recebida por uma equipa de hospitalização domiciliária, sublinhou o trabalho dos que levam os cuidados de saúde para fora do hospital. Mas a efeméride é, mais uma vez, marcada pelas reivindicações.
Marta Temido não deu respostas concretas, mas reconhece que é preciso mais no que diz respeito ao reconhecimento do trabalho dos enfermeiros.
“O facto de estarmos aqui mostra que estamos comprometidos com a resposta às questões que estão a ser colocadas”, disse aos jornalistas.
As questões estavam a ser colocadas à porta do Ministério da Saúde.
“Não temos tido contabilização nenhuma, está tudo congelado. O Governo já manifestou vontade, mas não há fumo branco sobre isso”, explica Ricardo Silva, enfermeiro há 19 anos no Hospital hoje visitado pela Ministra.
O protesto, organizado pelo Sindicado dos Enfermeiros Portugueses, incluiu a entrega de 13 caixas com 1.020 postais a exigir a imediata progressão na carreira. Um problema comum a muitos dos enfermeiros presentes.
“O Ministério achou por bem, às pessoas que transitaram para a carreira que por eles foi imposta, retirar os pontos que deveriam ter contado para trás. Isto quer dizer que tenho 10 anos de trabalho por contar numa carreira de 23 anos”, explica Elisabete Amuedo.
É sobre isso que é o decreto lei 71/19, e que Sindicato dos Enfermeiros Portugueses pede que seja alterado. Uma exigência legível nas camisolas amarelas, que desfilaram depois para o Campo Pequeno.
Com um piquenique, música e partilha de testemunhos, o dia de celebração do enfermeiro serviu também para perceber as diferenças entre as expectativas à entrada na profissão e o cenário encontrado.
“Imagino-me daqui a 10 anos a receber o mesmo, independentemente das formações que tire, seja especialista ou não. Os colegas recém-licenciados recebem o mesmo que colegas que terminaram o curso e que trabalham há 20 ou 30 anos, recebemos todos o mesmo”, explica uma enfermeira, entrevistada ao mesmo tempo que um colega com três décadas de profissão.
“Claro que não era isto com que sonhava quando comecei a carreira, as expectativas foram completamente abalroadas. Quando comecei tínhamos progressões de 3 em 3 anos, a idade da reforma era aos 57 anos, hoje está aos 66. Um disparate nesta profissão”, acrescenta.
O estudo da Universidade Nova e do Observatório para as Condições do Trabalho mostra que o índice de exaustão dos enfermeiros em Portugal está em 3.42, quando o limite aceitável é de 2 pontos.
Guadalupe Simões, dirigente do Sindicato, diz que há uma sensação de ingratidão e sublinha “ausência de medidas para reter enfermeiros que continuam a abandonar a profissão porque não aguentam mais” e explica como as passagens de serviço são feitas em choro por muitos e como gozar folgas é impossível em alguns serviços.
Depois da pandemia, já sem o susto inicial da covid-19 e com os serviços mais calmos, pelos testemunhos ouvidos no Ministério e no Campo Pequeno, a exaustão vai além das horas intensas de trabalho.
“Sinto-me exausta e não é pelo trabalho, é por estas injustiças de há uns anos para cá e pela forma como o Governo nos tem tratado”, remata a enfermeira Elisabete Amuedo.
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