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Quatro perguntas e respostas sobre João Rendeiro

Quatro perguntas e respostas sobre João Rendeiro

Quem era “o banqueiro dos ricos”, porque estava preso na África do Sul, como fica o processo que envolvia João Rendeiro e quem vai pagar as suas dívidas?

A morte de João Rendeiro na prisão de Westville, em Durban, na África do Sul, colocou um ponto final na odisseia de cinco meses do ex-banqueiro, detido a 11 de dezembro de 2021, após três meses de fuga à justiça portuguesa.

Quando faltava um mês para o arranque do julgamento do processo de extradição para Portugal, agendado para decorrer entre os dias 13 e 30 de junho, e a apenas uma semana da sessão preparatória, o antigo presidente do Banco Privado Português (BPP) foi encontrado morto na sua cela perto da meia-noite de quinta-feira, segundo os serviços penitenciários sul-africanos, que abriram uma investigação às circunstâncias da morte.

Quem era o “o banqueiro dos ricos”?

João Rendeiro foi o fundador do Banco Privado Português em 1996, conhecido como o “banco dos ricos”. O gestor ganhou notoriedade por conseguir multiplicar os investimentos de quem lhe confiava o dinheiro. O banco acabou por cair ao fim de 14 anos, deixando milhares de clientes arruinados e o Estado a perder centenas de milhões de euros.

O homem que acabou por ser conhecido como o “banqueiro dos ricos” nasceu em Lisboa em 1952 e era filho de um sapateiro. Conseguiu estudar em Portugal e fez um doutoramento em Inglaterra. No curso de economia criou um fundo que acabou por vender por 15 milhões. Tinha custado apenas 25 mil euros.

Em 1996 criou o Banco Privado Português e, ao longo dos anos, a instituição conseguiu ter 600 acionistas e 3 mil clientes. João Rendeiro recusou sempre que a instituição fosse apenas para ricos. Contudo, a verdade é que para se ser cliente deste banco, chegou a ser preciso um investimento mínimo de 1 milhão de euros.

João Rendeiro era também amante e colecionador de arte, tendo vários dos quadros, esculturas e móveis que detinha, entre outros bens, sido arrestados pela Polícia Judiciária com vista a ressarcir os lesados do BPP.

Durante 22 anos deixou transparecer uma vida rodeada de luxo, mas em 2008, a crise financeira deixou expostos os problemas do BPP.

A falência foi decretada 2 anos depois e no final das contas, a instituição ficou a dever mil e 600 milhões de euros a 6 mil lesados. Esta queda gerou perdas ao Estado de centenas de milhões de euros.

Porque estava preso na África do Sul?

João Rendeiro foi condenado a quase 20 anos de cadeia em processos relacionados com a ruína do Banco Privado Português. O tribunal provou que retirou do banco quase 14 milhões de euros.

O ex-banqueiro fugiu à justiça portuguesa, mas três meses depois, a 11 de dezembro de 2021, acabou por ser detido, na África do Sul, na sequência da investigação da Polícia Judiciária que contou com a cooperação internacional.

Seis dias depois, o juiz a que foi presente decretou que ficaria em prisão preventiva, no sobrelotado estabelecimento prisional de Westville, um dos motivos que levou o antigo banqueiro a pedir para ser transferido para outra prisão, mas o desejo foi-lhe negado.

Considerando que estariam a ser violados direitos humanos, solicitou à advogada que enviasse uma carta à ONU, a denunciar as condições do estabelecimento prisional e a pedir uma inspeção.

Rendeiro aguardava uma decisão sobre o processo de extradição para Portugal onde o esperava um julgamento marcado para o período entre 12 e 30 de junho, mas o ex-banqueiro opunha-se a esta possibilidade.

Em 2010 com a queda do Banco Privado Português, milhares de clientes foram lesados e o Estado também ficou a perder, mas já terá recuperado parte do valor. O escândalo motivou vários processos judiciais: burla qualificada, falsificação de documentos, falsidade informática e multas aplicadas pelas autoridades de supervisão bancária.

Já depois do ex-banqueiro estar preso na África do Sul, foi emitido um quarto mandado de detenção, relacionado com um processo ainda em investigação que tem por base o descaminho de obras de arte.

O que acontece ao processo com a morte de João Rendeiro?

Com a morte de João Rendeiro, o processo judicial contra o ex-banqueiro é encerrado, mas os outros arguidos continuam a responder à justiça.

Há dois dias, o Ministério Público tinha renovado a medida de coação da mulher de João Rendeiro por mais três meses por considerar que há perigo de fuga.

Maria de Jesus Rendeiro está ainda proibida de contactar com outros arguidos do processo como Florêncio de Almeida e o filho, ex-motorista de João Rendeiro. Está a ser investigada num processo relacionado com o desaparecimento das obras de arte arrestadas ao marido no caso BPP, é suspeita dos crimes de descaminho, desobediência, branqueamento de capitais e de crimes de falsificação de documento.

Um processo que continua a ser investigado apesar da morte de João Rendeiro

Quem vai pagar as dívidas do ex-banqueiro?

Os efeitos criminais dos processos que envolviam João Rendeiro, transitados ou não em julgado, extinguem-se com a morte, mas, do ponto de vista civil, herdeiros que recebam partes da herança serão responsáveis até ao limite do que receberem.

“A sua responsabilidade penal morre neste processo e continua em relação a outros arguidos. O que pode continuar é a responsabilidade civil e tudo depende se Rendeiro deixar alguma herança. Se houver património, que deixe para a mulher ou sobrinho, essas pessoas podem ser posteriormente chamadas a pagar essas indemnizações”, explica o jornalista da SIC, Luís Garriapa.