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Equipa do serviço de urgência do hospital Beatriz Ângelo apresenta demissão

O pedido de demissão acontece no dia em que o serviço de urgências pediátricas encerra durante o período noturno. Ordem dos Médicos e Sindicato Independente dos Médicos vão visitar o hospital.

Equipa do serviço de urgência do hospital Beatriz Ângelo apresenta demissão
Anders Clark / EyeEm

Onze chefes de equipa serviço de urgência geral do hospital Beatriz Ângelo, em Loures, apresentaram, esta quarta-feira, a demissão. O pedido acontece no dia em que a urgência pediátrica encerra durante o período noturno, entre as 21:00 e 09:00, e aos fins de semana.

Na carta enviada pelos chefes de equipa, a que a SIC teve acesso, os médicos destacam que o hospital Beatriz Ângelo “vive os piores momentos da sua história e vê-se a não cumprir o seu maior objetivo", ou seja, “a prestação de cuidados de excelência ao doente”.

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“Depois de com elevado esforço e sentido de dever, termos superado uma pandemia que exigiu a todas as instituições do Serviço Nacional de Saúde (SNS) o melhor dos seus profissionais, vivemos um presente de desespero por escassez de recursos humanos e olhamos para o futuro com enorme preocupação e desacreditação”, pode ler-se.

O profissionais de saúde destacam a “saída recorrente de especialistas do Serviço de Medicina Interna do Internamento e da Equipa Dedicada do Serviço de Urgência Geral” que tem “marcado” os últimos meses. Avisam que, por essa razão, as equipas estão “com poucos elementos e cada vez com menos diferenciação", o que se reflete "nos cuidados aos doentes”.

“Apesar dos múltiplos pedidos de resolução desta situação, das inúmeras escusas de responsabilidade dos elementos das equipas, da saída de tantos profissionais, nada foi feito a não ser pedir a estes profissionais, já cansados, que façam mais e mais horas."

Na sequência da demissão, o bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, e o representante do Sindicato Independente dos Médicos (SIM), Jorge Roque da Cunha, anunciaram que visitam esta quarta-feira o hospital.

Ministro promete diálogo com chefes de urgência

O ministro da Saúde prometeu diálogo com os chefes de equipa do Serviço de Urgência Geral do Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, que apresentaram a sua demissão, para perceber as suas motivações.

Manuel Pizarro, disse, à margem de uma iniciativa em Faro, não ter ainda informação sobre o pedido de demissão, mas afirmou que está a "acompanhar com muita atenção o que se está a passar no conjunto dos hospitais da Grande Lisboa".

"Isso obrigará a um diálogo com esses profissionais para perceber as motivações que estão por trás disso e para perceber como é que podemos ajudar a superar as dificuldades que estão a ser vividas também nesse hospital", disse o ministro.

Afirmando que o governo vai "reagir com tranquilidade" à situação, Manuel Pizarro frisou não ter "nenhuma dúvida de que a direção executiva do SNS já está a acompanhar a situação".

O ministro falava em Faro, durante numa visita às instalações locais do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), no âmbito da ação "Governo Mais Próximo", que decorre hoje e quinta-feira no distrito de Faro, com cerca de 60 iniciativas e a presença de vários membros do executivo.

Numa segunda declaração aos jornalistas, Pizarro reforçou a necessidade de atrair jovens médicos para as regiões “mais periféricas do país”, sublinhando que a pediatria é uma das áreas em que faltam profissionais de saúde. O ministro disse ainda que este ano temos “o maior número de pediatras em formação” - 101 médicos.

“Temos de formar mais profissionais porque nós teremos sempre que viver cm o facto de haver pessoas mais jovens que optarão pelo setor privado ou por viverem fora do país”, disse o ministro, ressalvando que “o SNS tem fixado cerca de 70% dos médicos que forma”.

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Manuel Pizarro explicou ainda que as medidas tomadas “são estruturais e vão demorar tempo a produzir todos os seus efeitos”, uma vez que a formação dos médicos pode demorar “quatro, cinco ou seis anos”.

“Quanto mais tarde começarmos, mais tarde teremos os resultados necessários para resolver o problema dos acesso das populações às diferentes especialidade”, sublinhou.

Ordem dos Médicos diz que “havia sinais”

Miguel Guimarães sublinha a importância de “valorizar o trabalho das pessoas”, por forma a atrair médicos para o SNS. Destaca ainda que em Portugal são formados, por ano, mais de 2.000 médicos.

“Nós temos condições, temos médicos, temos pessoas, temos de mudar a forma como estamos a valorizar o trabalho das pessoas”, disse o bastonário, classificando como “vergonha” a atual situação que se vive na saúde.

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Quando confrontado com a surpresa expressa pelo ministro Manuel Pizarro, o bastonário disse que “havia sinais de que isto poderia acontecer”, tanto no hospital Beatriz Ângelo como noutros hospitais do país.

“Isto não é novidade nenhuma para quem está dentro da saúde e sabe o que se passa nos hospitais e as dificuldades que existem neste momento. É obvio que isto não é surpreendente. O que é surpreendente é que isto não seja resolvido a tempo.”

Miguel Guimarães defende que é preciso dar autonomias às administrações hospitalares para fazerem a gestão dos médicos de forma eficaz e rápida. E destacou a urgência para a implementação deste novo modelo de gestão.

“Toda a gente está de acordo de que nós precisamos de mais capital humano no SNS”, sublinhou. “Nós temos de ter um novo modelo de gestão no SNS que permita mais flexibilidade e capacidade de fazer o que é necessário fazer. A verdade é que, neste momento, as administrações hospitalares não tem este novo modelo de gestão”, acrescenta.

Sindicato pede respostas ao Governo

Jorge Roque da Cunha, do SIM, sublinha que é “fundamental” que o Governo “encare estas questões de forma séria” e que “invista no SNS”, não apenas “nas palavras, mas nos atos”.

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O sindicalista sublinhou que “há mais de seis meses que os médicos do Beatriz Ângelo, através de escusas de responsabilidade, de reuniões com o conselho de administração, têm dito que as equipas no serviço de urgência estão abaixo do que é necessário”.

“O Dr. Manuel Pizarro e o Dr. Fernando Araújo conhecem muito bem os problemas e a solução é muito simples: investir no SNS”, afirma.

Roque da Cunha avança que a situação nas urgências pediátricas do Beatriz Ângelo pode demorar meses a estar resolvida e sublinha que “ainda hoje saem cinco pediatras para o privado, depois de ter saído uma colega pediatra para o Dona Estefânia”.

“Os esforços é só um: criar condições para que os médicos que existem no nosso país, que querem trabalhar no SNS que continuem a trabalhar”, remata.

Ainda durante a manhã desta quarta-feira, Roque da Cunha sublinhava que a situação que se vive no hospital Beatriz Ângelo é “insustentável” e critica o conselho de administração e o Governo por não terem “dado qualquer resposta quer ao alerta dos colegas, quer ao SIM”.

Em 2022, o hospital Beatriz Ângelo passou a ser parte da gestão pública do Serviço Nacional de Saúde, depois de 10 anos em regime de parceria público-privada (PPP).

Câmara de Loures aprova moção contra encerramento noturno de urgência pediátrica

A Câmara Municipal de Loures aprovou uma moção contra o encerramento noturno da urgência pediátrica do hospital do concelho, a partir de esta quarta-feira, assegurando o presidente da autarquia que não vai permitir que seja um fecho definitivo.

A tomada de posição, apresentada pela CDU, foi aprovada esta manhã por unanimidade durante uma reunião do executivo presidido pelo socialista Ricardo Leão.

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Em causa está o encerramento noturno da urgência pediátrica do Hospital Beatriz Ângelo (HBA), que serve os municípios de Loures, Odivelas, Mafra e Sobral de Monte Agraço, no distrito de Lisboa, e que já foi confirmado pelo ministro da Saúde, Manuel Pizarro.

Fecho das urgência pediátrica entra em vigor esta quarta-feira

O hospital Beatriz Ângelo anunciou esta terça-feira que o serviço de urgência pediátrica ia passar a funcionar apenas no horário diurno - entre as 09:00 e as 21:00 - e aos fins de semana. Esta decisão foi justificada pela “dificuldade de preenchimento das escalas”.

O Conselho de Administração do Hospital Beatriz Ângelo, juntamente com a Direção Executiva do SNS e com o Conselho Diretivo da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, decidiu que a partir de dia 1 de março vai ter novos horários para os serviços de pediatria.

“Com o objetivo de garantir previsibilidade e segurança aos utentes, (…) informa que a partir desta quarta-feira, dia 1 de março, o Serviço de Urgência Pediátrica desta unidade passa a funcionar de segunda a sexta-feira, entre as 9:00 e as 21:00”.

A decisão é “transitória” e advém da “dificuldade e preenchimento das escalas que não foi possível ultrapassar”, segundo informa o hospital.

Para colmatar as dificuldades, e de acordo com as informações já divulgadas pelo Ministério da Saúde, vai ser apresentado o plano de reorganização dos Serviços de Urgência Pediátrica da Área Metropolitana de Lisboa na próxima semana.