A médica Diana Carvalho Pereira, que apresentou uma queixa à Polícia Judiciária (PJ) sobre 11 casos de alegados erros médicos e negligência no Centro Hospitalar Universitário do Algarve, revela que colegas lhe contaram "histórias horríveis". A médica vai reunir todas as queixas e apresentá-las à Ordem dos Médicos. Num direto esta quarta-feira no Instagram pessoal, diz que não foi afastada do serviço pelo hospital, mas que foi a própria a pedir a suspensão. Garante ainda que teve o apoio de outros médicos para avançar com a queixa à PJ.
Diana Carvalho Pereira esclarece que não foi afastada do serviço pelo hospital, como foi dito pelo diretor, mas que foi a própria que pediu a suspensão do internato, “enquanto não houver um novo orientador ou uma eventual transferência para outro hospital”.
“Eu não fui despedida, eu fiz um pedido de suspensão, ou seja, fui eu que o fiz. Fi-lo porque há 15 dias fiz um pedido de mudança de orientador de formação e ninguém me respondeu. Entretanto fiz a queixa”.
Em direto no Instagram, revela que teve o apoio de outros médicos cirurgiões para avançar com a queixa à PJ, com “todas as provas necessárias, como exames complementares de diagnóstico, relatos cirúrgicos e relatórios de anatomia patológica”.
Há relatos de “situações horríveis”
“Fui contactada por diversos profissionais do hospital. Alguns relatam situações horríveis até noutros serviços”, afirma.
Diz também que “sofreu várias retaliações” desde que apresentou a queixa à Polícia Judiciária e garante que vai fazer queixa por difamação.
“Existem várias coisas que estão mal naquele serviço , tem a ver com vários profissionais (…). Não é uma situação em particular desta equipa, é do serviço e quiçá do hospital. Também me têm chegado queixas de outros serviços”, acrescenta.
A médica interna, de 27 anos, vai anexar todas as queixas num documento e apresentá-lo à Ordem dos Médicos.
“Sinto muita vergonha" do hospital
Diana, que é do Porto e estudou em Coimbra, aponta para diferenças nos hospitais públicos do Sul em comparação com os hospitais do Centro e Norte: "Os portugueses pagam os mesmos impostos em proporcionalidade com os seus salários, mas depois uns recebem saúde de primeira e outros de segunda. Não é justo".
A profissional salienta que nunca revelou os nomes dos especialistas em causa para proteger as famílias, “que não têm culpa dos atos praticados”.
“Sinto muita vergonha do que andei a aprender nos últimos três meses, ou a desaprender. Consigo perceber que nenhuma destas práticas vou levar para a minha vida”, considera, acrescentando que não tem medo das represálias.
Salienta ainda que nunca assistiu a uma reunião de morbimortalida, onde se discutem erros médicos.
“Sei de internos mais velhos que assistiram apenas a uma ao longo do internato. Como é que nos vamos tornar especialistas sem conseguir identificar o erro?”, questiona.
A médica, que se encontra de férias fora do país, diz, no entanto, que se sente "muito bem":
"Só quem realmente tem medo de alguma coisa é que responde com represálias tão baixas como me estão a responder".
No mesmo direto, deixa uma garantia: não tem vontade de voltar a trabalhar no Centro Hospitalar Universitário do Algarve.
“Não concordo com as práticas que lá se fazem, não concordo com a normalização destas situações de erro ou de negligência”.
Queixa à PJ
A médica apresentou uma queixa na Polícia Judiciária sobre "11 casos ocorridos entre janeiro e março" no Hospital de Faro de "erro/negligência" no serviço de cirurgia.
A médica, que tinha começado o internato há apenas três meses, acusa o orientador e o diretor de serviço de más práticas no serviço de cirurgia do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, que terão causado a morte a três doentes e lesões em vários outros.
Entretanto, Diana Carvalho Pereira foi afastada do serviço. A médica diz que pediu a suspensão da formação, até que lhe seja nomeado um novo orientador de internato.
O Centro Hospitalar Universitário do Algarve vai avançar com uma auditora à atividade clínica do serviço de cirurgia. Há um inquérito aberto pelo Ministério Público e outro pelo hospital. O caso está já também nas mãos da Entidade Reguladora da Saúde (ERS).