As experiências e as dificuldades dos alunos ciganos nas escolas são semelhantes às das crianças e jovens imigrantes, nomeadamente em termos de discriminação, revela um estudo nacional sobre trajetórias escolares dos estudantes ciganos no ensino secundário.
A constatação está presente no livro "Ciganos/Roma e educação - investigação colaborativa e práticas de coprodução de conhecimento", apresentado esta semana em Lisboa, e resulta de um projeto de investigação (EduCig - Desempenhos escolares entre os ciganos: investigação-ação e projeto de co-design), que procurou compreender as trajetórias escolares dos estudantes ciganos no ensino secundário.
A investigação foi feita em 2021 e incluiu entrevistas a alunos ciganos, além de trabalho de campo com a participação de estudantes e mediadores ciganos que iam a escolas das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto participar em 'workshops' e partilhar a sua experiência.
À Lusa, a coordenadora do trabalho de investigação explicou que nesses momentos o objetivo era "trabalhar com os alunos temas que tinham que ver com a multiculturalidade, o diálogo intercultural, o respeito pelo outro".
Manuela Mendes apontou que, apesar de as diferenças poderem ser muito diversificadas, o interesse da investigação estava nas diferenças culturais, raciais e étnicas.
"E mesmo não havendo entre o público, e aconteceu em algumas escolas, crianças e jovens ciganos, jovens de outras origens, por exemplo, afrodescendentes, jovens brasileiros, jovens chineses, identificaram-se, em grande medida, com os testemunhos que os jovens [ciganos] que nos acompanharam apresentaram", contou a socióloga.
Segundo Manuela Mendes, isso aconteceu tanto em relação a aspetos positivos da experiência dos alunos ciganos, quer em relação a "aspetos ligados à discriminação em contexto escolar", dando como exemplo casos de alunos que "só mais tardiamente" revelaram que eram ciganos, "quando sentiram condições de acolhimento para o fazer".
"Muitos [alunos estrangeiros] identificaram-se também com aquelas dificuldades, problemas, sentimentos que estes jovens [ciganos] retrataram", relatou, apontando que, por isso, algumas das recomendações feitas no estudo são transversais e irão beneficiar outros públicos que têm o mesmo tipo de dificuldades e não têm um acesso igualitário à escola.
Defendeu, por outro lado, que muitos dos jovens ciganos que participaram na investigação, alguns deles ativistas e que "assumem publicamente as suas pertenças em termos étnicos e culturais", podem servir como modelos de referência para outros jovens.
Manuela Mendes salientou que a escola pública tem cada vez mais uma diversidade maior, pelo que importa incluir não só os jovens, mas também as famílias e os representantes das pessoas ciganas, na definição de programas e de projetos políticos.
Uma recomendação que a investigadora defende que não se restrinja apenas à área da educação.
"É muito importante haver uma maior participação, maior envolvimento, encontrar mecanismos de coordenação de proximidade, que envolvam estas pessoas porque, no fundo, elas são o objeto destas medidas, mas muitas das vezes não têm uma voz ativa", sublinhou.
Este e outros dados do estudo, bem como as suas recomendações, são apresentados na sexta-feira, no Iscte - Instituto Universitário de Lisboa.
Mais acolhedora
A escola deve ser um lugar mais acolhedor para as crianças e jovens ciganos, defende um estudo, que recomenda o incentivo à participação das famílias, mediadores interculturais na escola, saúde ou trabalho e conhecimento da história ciganas
Por isso, "é muito importante incluir cada vez mais os jovens, as famílias e os representantes das pessoas ciganas na definição de programas e de projetos" nas escolas públicas, mas também noutras áreas.
"É muito importante haver uma maior participação, maior envolvimento, encontrar mecanismos de coordenação, de proximidade que envolvam estas pessoas, porque no fundo, eles são o objeto destas medidas, mas muitas das vezes não têm uma voz ativa na sua definição, na sua implementação", sublinhou, referindo que há "cada vez mais pessoas ciganas com ensino superior".
Acredita, por isso, que estas pessoas têm a formação técnica e académica adequadas a estarem à frente de organizações ou instituições ou serem, por exemplo, mediadores em entidades públicas ou privadas e, assim, "incluir a sua voz na definição destas medidas".
Por outro lado, que "a escola também tem que ser um lugar, obviamente, mais acolhedor" para as crianças e jovens ciganos e para as suas famílias, envolvendo-as "constantemente nas várias atividades", incentivando, para isso, a participação dos encarregados de educação quer na vida escolar, quer na vida social e comunitária da própria escola