O despacho das medidas de coação tem 74 páginas. A grande maioria -63- diz respeito à indiciação do Ministério Público, que tenta explicar os alegados crimes em causa. O juiz, em pouco mais de cinco páginas, sustenta que do que leu e ouviu não existem indícios da prática de qualquer crime.
O primeiro é relativo a um alegado esquema de Pedro Calado e Custódio Correia. O Ministério Público acredita que o empresário Custódio Correia patrocinava a equipa de ralis do autarca Pedro Calado para ter em contrapartida benefícios e vantagens na contratação pública.
O juiz Jorge Bernardes Melo explica que das provas que viu e dos testemunhos realizados não encontrou qualquer ilegalidade e que o grupo de empresas de Custódio Correia patrocina, desde 2016, uma série de pilotos e viaturas por considerar que este tipo de publicidade é rentável.
"Consideramos, igualmente, não se mostrar indiciado, muito menos fortemente indiciado, que o arguido Pedro Calado tivesse tido algum benefício, ou beneficiado de algum tratamento de favor, na celebração do seu casamento no Hotel Savoy Palace, no dia 27 de março de 2021", lê-se no despacho do juiz.
Diz o juiz de instrução que também aqui o Ministério Público não conseguiu provar que Pedro Calado recebeu um favor de Avelino Farinha num dos hotéis geridos pelo grupo AFA, onde Avelino Farinha era administrador. No despacho diz mesmo que Pedro Calado pediu um orçamento e que pagou o serviço.
“Consideramos, ainda, não se mostrar indiciado, muito menos fortemente indiciado, que o arguido Custódio Correia, com o propósito de obter adjudicações para a ‘Socicorreia Engenharia’, tivesse procedido à oferta de presentes de valor não concretamente apurado”, lê-se ainda no despacho.
Ou seja, para o juiz não se prova que Pedro Calado recebeu presentes de valor superior a 150 euros como retribuição de favores. Aliás, no despacho está descrito que esta era uma prática comum do grupo empresarial na altura do Natal, em que quase 300 pessoas e entidades recebiam prenda. Para o juiz, dar prendas no Natal é uma conduta tolerável e socialmente adequada.
"Em suma, nos autos não existe o mínimo indício de que tivesse existido um qualquer conluio entre o arguido Avelino Farinha, diretamente ou com a intermediação de Martinho Oliveira, e o arguido Pedro Calado, tendente à combinação dos procedimentos relativos à construção do Hospital Central e Universitário da Madeira", escrito no despacho.
Também neste caso, o juiz diz que o Ministério Público não conseguiu provar qualquer existência de crime na adjudicação e construção do Hospital Central e Universitário da Madeira.
Neste despacho que a SIC teve acesso, o juiz até começou por realçar que o depoimento de uma testemunha, neste caso, João Fino não podia ser usado, porque sendo Secretário Regional, ou seja, membro do Governo da Madeira, goza de imunidade. Logo a Assembleia Legislativa Regional devia ter sido informada pelo Ministério Público do depoimento, algo que não aconteceu, e assim o testemunho não foi usado como prova.