A comissão de inquérito ao caso das gémeas luso-brasileiras tratadas com o medicamento Zolgensma ouviu, esta terça-feira, o chefe da Casa Civil do Presidente da República sobre a sua intervenção no caso. Fernando Frutuoso de Melo negou que tenha havido "qualquer tratamento de favor" por parte de Belém.
Na intervenção inicial, assegurou desde logo, que “não houve favorecimento da Presidência”, apesar das “dezenas de emails” que recebem todos os dias.

Fernando Frutuoso de Melo disse que o filho do Presidente da República enviou um email a Marcelo Rebelo de Sousa em 21 de outubro de 2019 "sobre a situação das crianças" e perguntava como era possível ajudar para que as gémeas "pudessem ter acesso ao medicamento [Zolgensma] em Portugal".
Esse email foi encaminhado pelo Presidente da República para o chefe da Casa Civil perguntando se a assessora Maria João Ruela poderia "perceber do que se trata", e a mensagem seguiu depois para a consultora, que pediu "mais detalhes a Nuno Rebelo de Sousa", nomeadamente "se as crianças estavam em Portugal".
O chefe da Casa Civil descreveu depois a troca de correspondência dos dias seguintes e indicou que no dia 31 de outubro de 2019 o assunto foi remetido ao chefe de gabinete do então primeiro-ministro "de acordo com o procedimento acordado entre a Presidência da República e o Governo para a transmissão centralizada de correspondência".
"É este o procedimento padrão, dado tratar-se de matéria de competência governamental", salientou, indicando que é o procedimento "adotado em muitos outros casos".
Fernando Frutuoso de Melo disse também que nessa mensagem transcreveu o teor do email de Nuno Rebelo de Sousa e anexou "dois relatórios médicos e os cartões de cidadãs nacionais das duas crianças", mas não omitiu a identificação de quem tinha feito o pedido "para evitar uma eventual interpretação errónea" quanto a "qualquer tratamento diferenciado" por se trata do filho do chefe de Estado.
Frutuoso de Melo indicou que o filho do Presidente da República e os pais das crianças foram informados deste encaminhamento e de que "a decisão sobre o tratamento era exclusivamente médica, que cabia ao hospital dar resposta quando achasse adequado e que o assunto tinha sido transmitido ao Governo".
"Assim terminou a intervenção da Casa Civil", afirmou, vinca em resposta ao deputado João Almeida (CDS-PP) que “o dr. Nuno Rebelo não teve a resposta que esperava”.


Chefe da Casa Civil diz que nunca falou com Marta Temido
O chefe da Casa Civil do Presidente da República garantiu que nunca falou com a ex-ministra da Saúde Marta Temido sobre o caso das gémeas luso-brasileiras, dizendo que não havia lista de espera.
"Nunca falei com a ministra da Saúde [Marta Temido] sobre o caso. O caso foi tratado como qualquer outro caso. A questão da lista de espera foi um erro de perceção da minha parte e tratámos o caso como muitos outros", referiu Frutuoso de Melo, em resposta ao líder do Chega, André Ventura, na comissão parlamentar de inquérito ao caso das gémeas tratadas com o medicamento Zolgensma em 2020.
Questionado por André Ventura sobre a indicação, num 'mail', de haver possibilidade de haver lista de espera no atendimento das crianças em Portugal, o chefe da Casa Civil do Presidente da República disse que se enganou.
"Enganei-me. Não havia lista de espera. Deduzi", salientou.
Em resposta ao BE, o chefe da Casa Civil disse que não tem muito contacto com o filho do Presidente da República: "Conheço Nuno Rebelo de Sousa de calções. Conheço-o desde que comecei a trabalhar com o doutor Marcelo Rebelo de Sousa", na década de 1980, deveria ele ter "10 ou 11 anos".
Fernando Frutuoso de Melo ressalvou que isso "não quer dizer que tenha uma relação com ele".

"Não é um contacto com quem eu fale. Não é amigo, é conhecido, mas não é pessoa com quem eu fale regularmente", indicou.
Sobre a interferência do ex-consultor do Presidente da República para a Saúde Mário Pinto, o depoente explicou que nunca deu instruções e que os consultores "têm atividades que não dizem respeito à Presidência da República".
"Mário Pinto é consultor e continua a exercer a atividade médica. Nunca dei instruções a Mário Pinto. Todos os contactos de Mário Pinto não me diziam respeito. Não tenho conhecimento [que tenha contactado membros do Governo] . Houve situações que Maria João Ruela [assessora para os Assuntos Sociais e Comunidades Portuguesas] e Mário Pinto tenham contactado algumas entidades Isso é uma coisa e outra ter reuniões de com o Governo", observou após ser interrogado pelo deputado do PS João Paulo Correia.
De acordo com Frutuoso de Melo, o ex-consultor cessou funções no fim do primeiro mandato de Marcelo Rebelo de Sousa "em março de 2021".
"No início de 2021, estávamos em plena pandemia. Mário Pinto é uma pessoa com perfil de medicina familiar, com grande preocupação familiar. O Presidente da República que precisávamos de um consultor mais ligado à saúde pública", esclareceu, acrescentando achar "que fizemos o que tínhamos de fazer. Analisámos a situação, respondendo a Nuno Rebelo de Sousa e o dossier terminou aí", disse, acrescentado que a Casa Civil do Presidente da República nunca contactou a família.
Com LUSA