Alejandro fugiu assim que soube que constava da lista de alvos do regime de Maduro. Era assessor do Voluntat Popular na Assembleia Nacional, o partido de Leopold Lopez. Ao antigo analista económico só restavam duas opções: deixar o país ou ser preso.
A única ligação ao exterior era a namorada, uma filha de portugueses que tinha chegado à Madeira em 2018. E foi na Madeira que este venezuelano aterrou no dia de natal de 2019 para começar uma outra vida. Nos últimos cinco anos teve vários empregos e alguns dissabores, mas prefere lembrar o lado bonito da história.
“O importante é lembrarmo-nos do bonito e daqueles que me deram oportunidade numa altura em que não sabia falar [a língua], que não tinha papéis”, relembra Alejandro Goméz, luso-venezuelano.
Verónica tem 24 anos e estava a estudar fisioterapia, mas a crise económica mudou tudo. Apesar de ser filha de portugueses, entrou como estrangeira.
“No início eu não tinha ainda a nacionalidade porque o meu pai e a minha mãe achavam que não era preciso”, conta Verónica Gomes, luso-venezuelana.
E sem saber falar português conseguiu trabalho num restaurante, onde os clientes nem sempre foram simpáticos, mas tal como o marido prefere pensar no lado bom.
“A Madeira deu-me tudo o que eu tenho agora, eu cresci, tornei-me mulher, tive os meus filhos, casei-me, tive uma casa”, diz Verónica.
A história de Alejandro e Verónica é uma muitas que cabem nos números oficiais sobre a comunidade luso-venezuelana a viver na Madeira. A entrada de 12 mil pessoas em quatro anos teve impactos nos serviços públicos. O mais relevante serão os 1.500 alunos a mais nas escolas da Madeira.
“Eu diria que muitas escolas com esta diminuição progressiva que tem havido com o número de escolas, terá havido escolas que não encerram devido a esta vinda de alunos para cá”, explica Sancho Gomes, diretor regional das comunidades.
Manuel faz um intervalo nas viagens para falar dos últimos anos, desde que deixou a Venezuela onde era advogado. Trabalhou num restaurante, tentou a sorte em Espanha e sustentou-se na família como motorista, mas 2024 começou bem.
Já é português e está no bom caminho para voltar a ser advogado. Apesar do optimismo, não esconde que estes foram anos complicados.
O futuro está na Madeira, mas o coração continua na Venezuela, até tentou votar nestas eleições
“Renovar o passaporte é muito complicado, demora muito tempo e não permitiam fazer o registo para estas eleições”, explica Manuel Urdaneta, luso-venezuelano.
Também Andreína Dias não hesitou em comprar as passagens para Portugal em 2016 porque pai precisava de tratamentos oncológico. O curso de contabilidade feito na Universidade Central de Caracas não evitou que seguisse o caminho de quase todos os venezuelanos recém-chegados.
“Quando cheguei comecei a trabalhar na área da restauração, portanto servia cafés, nunca tinha servido cafés na minha vida”, conta Andreína Dias.
Um ano depois de estar a viver na Madeira entrou num banco, mas a necessidade de ter mais entrada de dinheiro fez com que tirasse um curso de estética e investisse num gabinete de massagens.
Oito anos depois, a integração é total, não ficou sequer o sotaque e quem a vê não sabe que faz parte dos 12 mil venezuelanos que se fixaram na Madeira para começar de novo.