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Tribunal suspende julgamento de violência doméstica porque arguido está demente

A decisão foi tomada pelo Tribunal da Relação de Coimbra. Os juízes entendem que o homem já não tem capacidade de defesa e por isso não pode ser julgado. É um acórdão que mostra um entendimento contrário às decisões que têm sido tomadas pela justiça em relação a Ricardo Salgado.

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Existem em Portugal cerca de 200 mil pessoas com demência, mas o código penal português nada diz sobre o que fazer quando um juiz tem no banco dos réus um arguido a quem a doença roubou capacidade cognitiva. 

Sem regras, o critério de decisão difere. O Tribunal da Relação de Coimbra decidiu, este mês, suspender provisoriamente o julgamento de um homem acusado de violência doméstica. 

Segundo a perícia psiquiátrica: “o arguido apresentava dificuldades de orientação temporal, misturava na mesma sequência acontecimentos com datas muito díspares (...) incapaz de prestar declarações em tribunal e de compreender e apreender com as penas que eventualmente lhe foram aplicadas”. 

“Os tribunais não tratam de vinganças, por isso aquilo que se pretende efetivamente é que a pena tenha algum resultado no arguido. Neste arguidos a condenação penal não vai ter qualquer efeito”, explica Maria João Rato, advogada do arguido com demência.

As três desembargadoras que analisaram o caso entendem que, à luz da lei portuguesa, o julgamento penal só é possível se o arguido tiver capacidade de se defender. 

“O que é que nós advogados nos confrontamos… com alguém que nem sequer nos pode dizer o que é que efetivamente aconteceu. ora, não há nenhum tribunal que possa tomar uma decisão sobre determinados factos  que não tenha a versão da outra parte, penso eu”, diz Maria João Rato. 

À data do alegado crime de violência doméstica, o homem, agora com 80 anos, foi considerado imputável, ou seja, capaz de distinguir o bem do mal. A demência é posterior.

“Aquilo que este acórdão da Relação de Coimbra tem de novidade é que vem efetivamente dizer que não se pode levar estas pessoas a julgamento e que estes processos devem ficar suspensos até à prescrição”, explica a advogada do arguido com demência. 

O tribunal da Relação de Coimbra suspendeu provisoriamente o processo e pediu nova avaliação psiquiátrica para determinar se a doença é crónica. 

O caso é semelhante ao de Ricardo Salgado. A defesa do antigo banqueiro também já pediu a suspensão ou a extinção total do processo por considerar que há incapacidade de defesa do arguido em julgamento. Mas no caso de Salgado a justiça tem tido um entendimento diferente. 

O julgamento continua e num dos processo onde já houve condenação o tribunal da Relação de Lisboa entendeu que a doença só deve pesar se Salgado vier a cumprir pena. Nessa altura deve ser o tribunal de execução de penas a decidir se o arguido deve ou não entrar na prisão.