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As revelações do fugitivo mais procurado pela justiça portuguesa

Suspeito de centenas de assaltos milionários e violentos, foi descoberto pela Investigação SIC oito anos depois, a milhares de quilómetros e num país com o qual Portugal não tem qualquer acordo de extradição. Numa entrevista exclusiva, Jeki Matos admite ter feito 200 vítimas e revela o plano para escapar da cadeia.

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A fuga teve contornos cinematográficos. Ao jeito de Steven Spielberg, o famoso realizador norte-americano, Jeki Matos conseguiu serrar, durante sete meses, as grades da cela 21 de Caxias, onde cumpria prisão preventiva há quase ano e meio por fortes suspeitas de centenas de assaltos milionários e violentos a jogadores de casino.

"Sim, a maioria eram chineses, mas nada disso de que estava a ser acusado, tráfico de várias coisas, nada disso é verdade, quem me conhece sabe que não andava nesse mundo", refere o fugitivo, em entrevista exclusiva à SIC.

Manuela Santos, diretora da Unidade Nacional Contraterrorismo da Polícia Judiciária, garante ter identificado vários crimes violentos cometidos pela organização criminosa da qual Jeki Matos fez parte.

“As vítimas eram atiradas ao chão, manietadas, amordaçadas, torturadas, obrigadas a fornecer códigos multibanco sob pena de morrer, ficaram traumatizadas."

O plano de fuga da cadeia de Caxias está por explicar

Como conseguiu evadir-se de uma cadeia de segurança elevada? Quem ajudou? Quem subornou? O que falhou em termos de segurança?

Oito anos depois, a Investigação SIC descobriu-o a milhares de quilómetros num país com o qual Portugal não mantém qualquer acordo de extradição, Israel.

As autoridades portuguesas já viram recusadas por duas vezes os pedidos de extradição.

“Não é possível extraditar um nacional do próprio país. E, portanto, Israel não extradita porque [Jeki Matos] é cidadão israelita e nós, neste caso, não podemos fazer nada, obviamente só com a concordância do próprio país onde ele está é que é possível extraditar alguém”, sublinha o juiz conselheiro Celso Manata.

À data diretor-geral dos Serviços Prisionais, Celso Manata admite ter detetado fortes indícios de corrupção.

“Tenho dificuldade em compreender como é que não se apurou que a grade estava a ser serrada porque um dos procedimentos obrigatórios da parte da segurança é bater nas grades das janelas com uma barra de ferro (...) alguém meteu a serra lá dentro, como é óbvio, porque este tipo de serras não existe dentro dos EP e, desde logo, há aqui indícios que houve o auxílio.”

Todo o plano de fuga

Em entrevista exclusiva à SIC, em Israel, Jeki Matos, o fugitivo, revela todo o plano de fuga. Admite ter comprado ajuda dentro e fora da prisão.

"Paguei cerca de 60 mil euros a guardas prisionais (...) para conseguir fugir (...), na prisão, fala mais alto o dinheiro, qualquer preso que quisesse corromper um guarda, tendo dinheiro, consegue facilmente fazê-lo, foi o meu caso também. Comprei telemóveis, serras metálicas, tinta, cimento, entre outras coisas".

O luso-israelita assegura ter sido discriminado na cadeia por ser judeu. E confirma ainda que pagou "a guardas prisionais para conseguir colocar na mesma cela dois reclusos amigos que participaram no plano de fuga", dois chilenos, suspeitos de vários assaltos a residências de luxo e que viriam a ser detidos, em Madrid, no mesmo dia em que apanhava voo para Telavive, em Israel.

Revela que comprou a passagem aérea no próprio dia da fuga, tendo apresentado no check-in do aeroporto de Barajas, em Madrid, o passaporte israelita que a Polícia Judiciária não apreendeu durante a operação de buscas em 2015.

"Era português e israelita, aliás tinha dois nomes, foi assim que conseguiu passar no aeroporto, com o nome israelita", revela Celso Manata.

O fugitivo mais procurado pela justiça portuguesa reside em Israel numa localidade próxima de Telavive onde se encontrou com a equipa de reportagem da SIC.

"Sou uma pessoa diferente, arrependo-me dos crimes"

"Tenho uma vida normal, trabalho há oito anos na mesma empresa. Renasci. Sou uma pessoa diferente, arrependo-me dos crimes que cometi", admite Jeki Matos.

Sem medo de uma eventual extradição que considera "impossível" face à lei do Estado de Israel, ou de ser julgado no país pelos crimes que praticou em Portugal, o luso-israelita admite que os assaltos a "duas centenas de jogadores de casino" lhe renderam mais de "um milhão de euros”.

A Investigação SIC revela todo o plano de fuga, os cúmplices, os lençóis usados como corda para atravessar o muro, os esconderijos improvisados dentro da própria cela; a estratégia planeada durante cerca de um ano para ser executada "num sábado de nevoeiro" e o carro comprado no OLX para escapar de Caxias e seguir até à capital espanhola.

Os nomes dos dois guardas prisionais que terão colaborado no plano de fuga foram identificados por Jeki Matos nesta reportagem, mas a SIC optou por não os revelar publicamente.

"Sem ajuda dos guardas prisionais, teria sido impossível fugir (...) eles sabiam no plano de fuga", revela.

"Esse senhores não são guardas prisionais, são indivíduos que vestem uma farda porque um guarda prisional que honra a farda que veste não entra nesses esquemas de corrupção, sublinha Frederico Morais, presidente do Sindicato Nacional do Corpo da Guarda Prisional.

Lembra ainda que "se nós tivermos uma maçã podre numa fruteira vai influenciar as outras maçãs e vai apodrecer e se nós conseguirmos tirar essas maçãs para nós é muito importante" sublinha o dirigente sindical.

Frederico Morais admite continuar a ter relatos de maçãs podres no sistema, mas promete "combatê-las constantemente". O inquérito instaurado, à data, pelos serviços prisionais foi arquivado, não identificou indícios de corrupção, nem violações dos deveres funcionais de qualquer funcionário.