A maioria das crianças não cumpre as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre atividade física, tempo de ecrã e sono. Estes comportamentos são inevitavelmente entraves ao desenvolvimento saudável. Rita Cordovil explica que as férias devem ser aproveitadas para proporcionar às crianças maior atividade física, em que possam explorar novos contextos e correr alguns riscos.
"Sei que é um bocadinho estranho para os pais sentirem que devem incentivar as crianças a correr riscos (...) Nós temos um problema que é a sociedade super protetora em que vivemos e que é relativamente recente. A partir da década de 1980, houve como que uma reviravolta na forma como a infância é vivida e as crianças passaram a ficar cada vez mais tempo em casa e, nas férias, isso às vezes também acontece e muitos pais têm muita dificuldade em pensar em atividades que os consigam tirar dos ecrãs", realça, em entrevista na SIC Notícias.
A professora da Faculdade de Motricidade Humana aconselha os educadores a deixarem as crianças brincar livremente, sem serem sempre supervisionadas por adultos.
"Quando os adultos pensam nas brincadeiras preferidas que tiveram na infância, os adultos da minha geração normalmente pensam numa atividades divertidas feitas com amigos, na rua e sem adultos a vigiá-los. Este tipo de brincadeira e com um risco em que se possa testar os limites, se possa trepar a uma árvore, andar de carrinhos de rolamentos na rua, acabou por desaparecer. Hoje em dia as crianças estão muito superprotegidas e normalmente têm brincadeiras muito controladas em casa e com supervisão".
A especialista sublinha a importância de correr riscos controlados para um desenvolvimento saudável.
"Ninguém começa a andar sem arriscar. E as crianças têm de ir rendo cenários de risco controlado para os pais é muito complicado, mas a actividades em família, os passeios na natureza que se podem fazer e da chave ao parque, saídas à noite. Óbvio que não vou dizer a deixem a criança fazer coisas super arriscadas que não se sentem confiantes. No início, um pai pode dizer, olha, apoia o pé aqui quando estás a subir à árvore ou ajudar a descer porque a criança subiu e percebes é mais complicado. Mas gradualmente é mesmo importante que se vá dando maior autonomia às crianças".
"Geração ansiosa"
Quando as recomendações de sono, tempo de ecrã e atividade física não são seguidas, a saúde física e mental fica comprometida.
"Estamos a criar o que tem sido cada vez mais chamado de uma geração ansiosa e que se começa a notar na adolescência, principalmente nas raparigas está a acontecer um com um bocadinho mais intensidade do que nos rapazes, porque esta dependência dos ecrãs, uma infância baseada nos ecrãs, em vez de uma infância baseada no brincar e no brincar livre em que eles podem tomar decisões por eles próprios em que aprendem a gerir as emoções quando falham".
Apesar de compreender as dificuldades que os pais podem ter em colocar os filhos sem supervisão e em situações mais complexas, em que correm riscos e erram, a investigadora explica como são necessárias para o desenvolvimento das crianças.
"Quando as crianças brincam, podem errar, os erros não têm grandes consequências. Hoje em dia parece que temos medo que as crianças errem. Há uma série de benefícios que quando brincamos com pessoas reais, sem ser em cenário virtual, temos de aprender a lidar com as emoções dos outros, não podemos só desamigar alguém ou sair de um grupo quando estamos numa relação face a face. Isto é muito importante para o futuro que estamos a construir.
As crianças têm de aprender desde cedo a lidar com situações complicadas e irem tendo autonomia para as gerirem por si próprias", aconselha Rita Cordovil .