João Lopes

Comentador SIC Notícias

Cultura

Sessão de Cinema: “Identificação de uma Mulher”

Directa ou in directamente, a obra de Michelangelo Antonio reflecte os dramas do trabalho artístico: este é um notável exemplo da sua visão do próprio cinema.

Daniela Silverio filmada por Antonioni, ou o labirinto das relações humanas
Daniela Silverio filmada por Antonioni, ou o labirinto das relações humanas

A filmografia de Michelangelo Antonioni (1912-2007) é bem conhecida no mercado português, tendo uma presença significativa nas plataformas de streaming. E não apenas, sublinhe-se, através dos títulos dos anos 50/60, vitais na reformulação das coordenadas do cinema italiano pós-neo-realismo. Assim, vale a pena revisitarmos "Identificação de uma Mulher" (1982), derradeira longa-metragem que Antonioni dirigiu a solo — problemas de saúde fizeram com que, mais tarde, "Para Além das Nuvens" (1995) fosse realizada com o apoio de Wim Wenders.

Estamos perante uma teia melodramática cujo pano de fundo é o próprio cinema. Seguimos, assim, os passos de um cineasta que, depois de se separar da mulher, tenta encontrar uma figura feminina para o seu próximo filme… Essa procura acaba por conduzi-lo a outra mulher, levando-o a perguntar se, realmente, se trata de uma demanda artística ou puramente intimista, porventura egoísta…

Com Daniela Silverio e Christine Boisson a contracenarem com Tomas Milian (intérprete de muitos "western-spaghetti" que Antonioni transforma numa espécie de alter-ego), desenha-se um triângulo existencial em que a própria possibilidade do amor é posta à prova.

Através de uma metódica aproximação realista, "Identificação de uma Mulher" acaba por desembocar numa paisagem em que cada personagem é levada a questionar o seu próprio lugar. Sem nunca ceder a convenções "psicológicas", Antonioni é, afinal, em última instância, um dos mais subtis retratistas das relações humanas na segunda metade do século XX.

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