Foi há quase um século, mais precisamente em 1928, que se estreou na Broadway uma das peças mais célebres do seu historial: "The Front Page", uma comédia sobre o mundo do jornais, aliás escrita por dois veteranos do jornalismo, Ben Hecht e Charles MacArthur. A agilidade dos diálogos e o calculado sentido crítico da narrativa fizeram com que Hollywood produzisse várias adaptações da peça, sendo "His Girl Friday" a mais célebre, porventura a mais sofisticada.
Produzido em 1940 — lançado em Portugal com o título "O Grande Escândalo" — este é, de facto, um filme que ilustra exemplarmente um modelo de comédia em que a exuberância dos diálogos não é estranha à dimensão burlesca das situações. Ou seja, tudo aquilo que entrou para a história como "screwball comedy".
No seu centro está o par de jornalistas Walter/Hildy — notáveis interpretações de Cary Grant e Rosalind Russell —, ex-marido e mulher, que se veêm enredados numa confusão que envolve as autoridades policiais. Com uma componente ironicamente romântica que vale a pena sublinhar, até pelo seu carácter insólito; e não apenas porque Walter aposta em reconquistar Hildy; na verdade, essas duas personagens são, na peça, dois homens, tal como acontece, por exemplo, na versão "The Front Page/Primeira Página" (1974), em que Billy Wilder dirigia Jack Lemmon e Walter Matthau.
Enfim, importa não esquecer que este é um exemplo do génio do realizador Howard Hawks (1896-1977) na comédia, ao longo de várias décadas do cinema americano — lembremos "As Duas Feras" (1938), "A Culpa Foi do Macaco" (1952) e, claro, "Os Homens Preferem as Loiras" (1953). Dito de outro modo: este é um caso emblemático de uma tradição que, convenhamos, tem pouca expressão na produção do século XXI — são razões especiais para ver ou rever "O Grande Escândalo", até porque a cópia disponível é impecável na transcrição de uma fotografia a preto e branco, assinada por Joseph Walker, típica do melhor que, na época, se fabricava em Hollywood.
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