Para além do interesse desportivo que gera, a prova permite colocar à experiência propostas de inovação no jogo e de melhoria no espetáculo.
Se bem se recordam, foi o que aconteceu com o muito pouco tecnológico "spray" (que supostamente ajudaria os árbitros a colocarem as barreiras à distância, aquando da execução de pontapé-livres), com a introdução da vídeo arbitragem e com a linha semi-automática do fora de jogo.
Todas as iniciativas acabaram por ser mais tarde abraçadas pela indústria, sendo hoje parte integrante do processo de decisão.
Este ano, a competição que se disputa em Marrocos é a casa de outro teste, mais arrojado mas inevitável no cenário atual: o de permitir que os adeptos no estádio e quem está a acompanhar os jogos, em casa, possam ouvir o árbitro a explicar a decisão que foi alvo de vídeo intervenção.
Trocando por miúdos: FIFA e o IFAB foram sensíveis aos pedidos de federações, clubes e público e decidiram tentar oferecer mais clareza e transparência às decisões das equipas de arbitragem.
O teste agora aprovado - que teve o seu momento dourado logo no jogo de abertura deste Mundial (Al Ahly/Auckland) - permite que cada árbitro utilize um microfone de lapela, para poder explicar o que fundamentou a decisão final.
Convém não confundir este avanço extraordinário com outro que também se pede há muito, o de ouvir a troca de conversas entre VAR e árbitro principal.
Ainda não chegámos lá. Um passo de cada vez, porque importa também perceber o "nível de entusiasmo" das pessoas face à novidade. A ideia é esclarecer, credibilizar e humanizar, não provocar pequenos motins ou tumultos nas bancadas.
Imaginem que num dos nossos derbys ou clássicos mais acalorados, o árbitro comunicava que havia lugar à marcação de um pontapé de penálti favorável à equipa forasteira... no último segundo de um jogo que decidia um troféu.
Está bonito de ser ver, não está?
O avanço da tecnologia e a sua capacidade em tornar o processo de decisão mais célere e justo é tudo o que o futebol precisa, mas a verdade é que jamais será motivo de consensos. Jamais fará com que a pequena conflitualidade, a dúvida ou a suspeição desapareçam de vez, porque esta é uma indústria onde a componente emocional se sobrepõe a todas as outras.
Convém relembrar: antes desta surgiu a tecnologia VAR em si. Antes dessa a linha tecnológica do fora de jogo. Antes ainda o sistema de comunicação entre equipas de arbitragem e as bandeirolas com sinal bip.
Todas as novidades foram aplaudidas, mas nenhuma sanou a dificuldade do adepto em lidar com o erro, onde o erro dificilmente poderia ser corrigido pela máquina.
O problema de fundo é e será sempre cultural. E esse deve ser "atacado" lado a lado com estas maravilhas tecnológicas, que muito acrescentam à verdade do jogo.
O ex-árbitro internacional Duarte Gomes é comentador da SIC e tem um espaço de opinião no site da SIC Notícias.