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Botafogo é campeão brasileiro: Artur Jorge vence dois títulos em nove dias

Depois de Jesus e Abel, Artur Jorge torna-se no terceiro português a vencer a Libertadores e o Brasileirão, título que escapava ao Botafogo desde 1995. Nos últimos quase 30 anos, o ‘Glorioso’ desceu de divisão três vezes. O renascer deste clube, que aguentou todas as crises, não podia ser de outra forma: com sofrimento do início ao fim.

Artur Jorge
Artur Jorge
Ricardo Moraes

Diz-se que há coisas que só acontecem com o Botafogo. Como, por exemplo, deixar escapar um campeonato quando teve 13 pontos de vantagem na liderança - e ainda terminar no quinto lugar. Ou, em plena final de Libertadores, ter um jogador expulso aos 40 segundos - e mesmo assim acabar campeão. É uma equipa que nem nas vitórias escapa ao drama. Talvez por isso sejam ainda mais especiais. Ao inédito título da América, junta agora o Brasileirão, que eleva o português Artur Jorge a um lugar único na história do clube.

O Nilton Santos, estádio que carrega o nome de uma das maiores lendas do emblema do Rio de Janeiro, foi o palco da festa. Este domingo, o triunfo contra o São Paulo, por 2-1, na última jornada, garantiu o terceiro campeonato brasileiro da história do 'Glorioso', o primeiro deste século - os outros foram em 1968 e 1995. Um ano depois do título nacional que escapou para o Palmeiras, o Botafogo fecha mais uma cicatriz.

“2024 está a ser um ano tremendo”, disse Artur Jorge à SIC, antes da partida que culminou no título brasileiro, mas já depois da conquista da Taça Libertadores, no jogo "mais importante da carreira". “O meu maior orgulho é poder dizer que temos também nomes portugueses nesta página escrita a ouro na história do Botafogo."

Depois de Jorge Jesus, pelo Flamengo, e Abel Ferreira, ao serviço do Palmeiras, Artur Jorge torna-se no terceiro treinador português a vencer a Libertadores e o Brasileirão. Mas este não é o único marco atrelado ao troféu: o Botafogo do minhoto entra para a história como a terceira equipa a conquistar o Brasil e a América do Sul no mesmo ano, juntando-se ao Santos de Pelé e, outra vez, ao Flamengo de Jesus.

São, também, os dois primeiros títulos de ‘primeira linha’ da carreira de Artur Jorge, que em abril trocou o SC Braga pelo clube da estrela solitária. Em Portugal, venceu a Taça da Liga em 2023/24.

A ‘final’ com o Palmeiras e o adeus aos fantasmas

Numa conferência de imprensa no final de setembro, quando o ‘Glorioso’ já liderava o Brasileirão, o capitão Marlon Freitas foi questionado sobre a “volta por cima” da equipa após a perda do título no ano anterior. Artur Jorge, nitidamente irritado, interrompeu o jornalista e disse que não fazia sentido comentar um passado “ultrapassado”.

O treinador não estava no Botafogo na última época, nem a maioria dos jogadores de destaque na temporada atual, como Luiz Henrique, Igor Jesus, Savarino e Thiago Almada, que formam o quarteto ofensivo da equipa. Dos habituais titulares, só Marlon Freitas viveu o antes e o depois. Ainda assim, três empates seguidos em novembro, na reta final do campeonato, chegaram para relembrar os fantasmas de ontem.

O Palmeiras foi encurtando a distância até, no dia 23, igualar os pontos do ‘Fogão’ e assumir a liderança. Na jornada seguinte, a três do fim, estava marcada a ‘final antecipada’. Era impossível, pelo menos para adeptos e jornalistas, não recordar o jogo entre os dois postulantes ao título em 2023 - que terminou numa épica reviravolta da equipa de Abel Ferreira, por 4-3, depois de estar a perder 3-1 aos 84 minutos.

Na altura, apesar da derrota, o Botafogo não perdeu a liderança, cenário que viria a acontecer nas semanas seguintes. Agora, era preciso vencer para recuperá-la. E o duelo seria disputado em São Paulo, num Allianz Parque lotado, casa do rival. Faz sentido que, perante os jornalistas, Artur Jorge evitasse falar do passado, mas, no balneário, antes do encontro decisivo, Marlon Freitas não escondeu as dores, usou-as como motivação.

“Tudo tem um propósito, eu acredito muito nisso. Tinha de ser aqui. Tinha de ser contra eles, nessas circunstâncias. Foi assim com este grupo o tempo todo. Sempre duvidaram de nós. Ninguém acreditava em nós. Mas chegámos aqui, sabem como? Porque eu acreditei nele, ele acreditou em vocês. A gente se abraçou. Não dava para mudar nada. Tinha que ser assim e é assim que vai ser", gritou o capitão para os companheiros.

Ora, o que se viu no relvado, há menos de duas semanas, mostrou que não existia fantasma capaz de assombrar o alvinegro carioca. Na equipa de Artur Jorge não havia pernas trémulas, olhos dispersos, nem qualquer outro atestado de nervosismo. O 3-1 com que saiu do campo do Palmeiras, outrora algoz, não só recolocou o destino nas suas próprias mãos, como serviu de combustível para a final da Libertadores, três dias depois.

Em 12 dias, o Botafogo despachou o Palmeiras, em São Paulo, sagrou-se campeão da Libertadores, em Buenos Aires, venceu o Inter, no Rio Grande do Sul, e conquistou o campeonato brasileiro, no Rio de Janeiro. Lá, na cidade maravilhosa, os jogadores já tinham celebrado, ao lado de milhares de adeptos, o título continental. Mas Artur Jorge colocou um travão na farra, porque ainda havia mais uma "final para ganhar". Agora, a festa não deve ter hora para acabar.

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