Coronavírus

Opinião

O que explica a "semana de contenção" 

A "semana de contenção" tem, ou não, fundamento em princípios da saúde pública?

O que explica a "semana de contenção" 
Bloomberg Creative

A definição e posterior alargamento da chamada "semana de contenção" para controlo da pandemia causou reações díspares. À parte da avaliação política (que deixo para outros), das implicações económicas (resolúveis com apoios justos e rápidos) e de contradições nalgumas medidas (passíveis de correção), destaco uma crítica em particular: a suposta falta de fundamento nos princípios da saúde pública. A crítica sustenta-se nos argumentos de que medidas não farmacológicas destinadas à população como um todo não fazem sentido perante a estabilização da pressão dos cuidados de saúde, que a esmagadora maioria das pessoas está vacinada e porque deve ser assumido com relativa normalidade o facto da Covid-19 provocar complicações de saúde em pessoas idosas e com outras doenças.

Por isso exige-se responder à pergunta: a "semana de contenção" tem, ou não, fundamento em princípios da saúde pública? A resposta é sim.

Em primeiro lugar, tem fundamento no princípio da precaução. As dúvidas suscitadas pela Ómicron são muitas e é preciso fazer um compasso de espera enquanto se aguardam novas evidências científicas. Sabe-se que a variante é mais transmissível, mas não o seu impacto nos sistemas de saúde. Os dados preliminares são confusos: têm sido reportados sintomas ligeiros, mas a hospitalização está a aumentar em vários países, inclusive em idades pediátricas. Nem os motivos deste aumento nem o perfil das pessoas hospitalizadas são claros. A verdade é que a proteção conferida pelos esquemas vacinais tornou-se mais incerta face a outras variantes do vírus. Acresce a preocupação com o aumento dos contactos familiares dentro de portas durante a quadra festiva.

Em segundo lugar, tem fundamento no princípio da não maleficência, ou seja, aquilo que causa um mal menor. Tenta-se o que é possível durante a interrupção letiva para garantir o regresso de crianças e jovens ao ensino presencial o mais depressa possível. Mas também garantir o regular funcionamento dos cuidados de saúde, sabendo que a multiplicação de infeções significa o aumento do absentismo dos profissionais de saúde.

Em terceiro lugar, tem fundamento no princípio da proporcionalidade, aqui traduzido na imposição dos meios menos restritivos à vida quotidiana. É inequívoco o quanto as medidas tentaram preservar liberdades individuais perante o elevado grau de incerteza que se vive.

Em quarto lugar, tem fundamento no princípio da evidência disponível. À luz do que se sabe e do que falta saber, os países estão relativamente alinhados nestas decisões, o que aliás é corroborado pela Organização Mundial de Saúde ou pelo Centro Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças.

Em quinto lugar, tem fundamento no princípio da reciprocidade, na medida em que diversos apoios financeiros visam atenuar os efeitos destas medidas no menor rendimento das famílias. Uma discussão diferente é se estes apoios são justos ou adequados.

Em sexto lugar, tem fundamento no princípio da equidade, traduzido na não discriminação das pessoas. Por via da utilização de testes consegue-se evitar aquilo que noutros países começa a vislumbrar-se como a discriminação das pessoas em função da adesão à vacinação.

Em sétimo lugar, tem fundamento no princípio da transparência. A comunicação dos decisores políticos foi clara quanto à motivação destas decisões: ganhar tempo para perceber o efeito da Ómicron numa população amplamente vacinada e que uma revisão da situação epidemiológica acontecerá no início de janeiro.

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