O relógio marcava 7h48 minutos quando José Sócrates saiu da Ericeira, esta quinta-feira, rumo ao Campus de Justiça, em Lisboa. Já tinha jornalistas à espera mas esclareceu que só falaria à entrada do tribunal e assim foi.
Habituado ao alvoroço que a sua presença sempre suscita no Campus da Justiça, que inaugurou quando era primeiro-ministro, talvez José Sócrates esperasse esta manhã alguma condescendência por parte dos jornalistas.
Tinha começado com a prometida declaração e já o principal arguido da Operação Marquês estava a ser interrompido e reagiu, libertando o ‘animal feroz’ que lhe deu fama: “A sua intenção é não me deixar falar, mas eu vou falar na mesma”.
E falou para eleger, sobretudo, dois alvos: o procurador-geral da República, Amadeu Guerra, e o “lapso de escrita” que, vincou, “foi um estratagema, uma manigância que arranjaram para me forçar vir hoje outra vez a tribunal (…) ao mudar o crime mudou a moldura penal e mudou o prazo de prescrição”.
A mudança a que José Sócrates se refere é a transformação do crime de corrupção para ato lícito em corrupção para ato ilícito, alega Sócrates que o "i" a mais foi o que permitiu às juízas da Relação deitarem abaixo a decisão do juiz de instrução Ivo Rosa.
Em 2021, o juiz ilibara Sócrates de quase todos os crimes que constavam da acusação de 2017. Em 2024, o Tribunal da Relação concordou com os termos da acusação e o julgamento avançou. E aqui chegados, ouvimos o antigo primeiro-ministro ‘disparar’ contra a juiz presidente, o Tribunal da Relação e o Ministério Público
“Eu admito um lapso de escrita, mas quem acredita que sete procuradores se enganem ao fim de 4 anos, foi apenas um expediente para que as senhoras juízas, mudassem o crime e me fizessem vir a julgamento, a senhora juíza o que quis foi este circo”
Se aqui fora o tom foi este, dentro da sala de audiências, depois da sessão começar, o advogado do ex-primeiro-ministro fez sucessivos requerimentos a invocar nulidades.
Por entender que o Conselho Superior da Magistratura (CSM) está a gerir administrativamente este processo, colocando juízes em exclusividade e criando um grupo de apoio, igualmente em exclusividade, Sócrates pediu recusa de juíza. Mas também avançou com um pedido de recusa de procurador-geral da República. Sócrates não quer que Amadeu Guerra interfira neste processo.
Em declarações ao jornal Observador, Amadeu Guerra disse que devemos dar oportunidade ao engenheiro José Sócrates de provar a sua inocência.
“(…) é muita generosidade do senhor PGR dar-me uma oportunidade, é muita generosidade (…), essa declaração do PGR é absolutamente violadora de tudo aquilo que são os princípios básicos do Estado de Direito”.