Afeganistão

Entrevista SIC Notícias

Santos Silva sobre o Afeganistão: "Falhámos o objetivo de formar as instituições"

O ministro dos Negócios Estrangeiros português avança as linhas vermelhas para que o Afeganistão seja reconhecido pela comunidade internacional.

Santos Silva sobre o Afeganistão: "Falhámos o objetivo de formar as instituições"
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O ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, apontou, esta terça-feira na Edição da Noite da SIC Notícias, as "linhas vermelhas" que serão colocadas ao novo Governo talibã no Afeganistão e admitiu que a missão internacional "falhou um objetivo".

Depois dos talibã terem entrado em Cabul e o Presidente afegão ter abandonado o país, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal afirma que “vivemos um tempo de expectativa” e que a atual posição de Portugal e dos restantes países “só pode ser de esperar para ver”.

Sobre a mudança de abordagem do grupo radical, expressa na primeira conferência de imprensa do líder dos talibã, o ministro português lembra que já se conhecem as práticas do grupo extremista.

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O representante da diplomacia portuguesa afirma que o país tem por norma “reconhecer países” e não Governos. No entanto, sublinha que há duas linhas vermelhas boas relações com o Afeganistão: a segurança e os direitos humanos.

“A linha vermelha, não apenas para Portugal mas para a comunidade internacional, é que o Afeganistão em nenhuma circunstância pode volitar a ser o santuário do terrorismo internacional dirigido especificamente e brutalmente contra para os cidadãos ocidentais que já foi no passado”, afirma.

Também os direitos humanos e das mulheres é “a segunda linha vermelha”: “Para podermos ter uma interação minimamente produtiva com as novas autoridades afegãs é a evolução positiva que o país teve nas últimas décadas no que diz respeito aos padrões de cumprimento dos direitos humanos, em particular no direito das meninas e das mulheres, não pode ser agora posta em causa”

O ministro afirma que Portugal irá ficar vigilante, mas lembra que não devem respeitar os assuntos internos de cada país. No entanto, deixa um alerta para o novo Governo afegão:

"Se o Afeganistão não quer ser um estado pária, não quer voltar ao isolamento internacional, se quer ter relações mínimas com a União Europeia e com os países europeus - nomeadamente no que diz respeito ao apoio em matéria de assistência humanitária e ao apoio ao desenvolvimento - se quiser continuar no concerto das nações, então há requisitos relacionados coma segurança e os direitos humanos que têm de ser cumpridos nesse país."

► "Falhámos um objetivo"

O ministro português lembra que a campanha no Afeganistão teve por início os atentados de 11 de Setembro, que celebra este anos o 20.º aniversário.

"O que nós procurámos fazer foi impedir que o Afeganistão continuasse a ser um santuário para a Al-Qaeda. Isso foi impedido e ao longo destes 20 anos não houve um único atentando terrorista em solo Europeu ou da América do Norte que tivesse sido preparado e organizado no Afeganistão", afirma o Santos Silva.

No entanto, o ministro dos Negócios Estrangeiros refere que a comunidade internacional falhou um dos objetivos a que se tinha proposto.

"Falhámos um objetivo: formar as instituições políticas e administrativas do Afeganistão e também que as suas forças armadas e de segurança, para que elas assumissem a função básica de qualquer Estado, que é garantir a segurança do seu território e a segurança e o bem estar da sua população."

E as lições ficam para o futuro:

"Nós não resolvemos o problema do terrorismo internacional, do colapso dos Estados e das instituições, da instabilidade vivida em várias regiões, sem enfrentar as causas profundas de todos esses problemas. Muitas vezes estão nas desigualdades, no desrespeito por minorias religiosas éticas ou nacionais e, portanto, não nos chega a ação militar. A ação militar é muitas vezes importante e determinante, mas as missões civis, de capacitação, de desenvolvimento são muito mais importantes", afirmou o ministro.

► Portugal junta-se à NATO para resgatar afegãos que colaboraram outros países

Apesar de não haver muitos colaboradores que tenham trabalhado diretamente com o contingente português, Augusto Santos Silva destaca que é uma questão de "honra" salvar quem colaborou, ao longo dos anos, com os militares estrangeiros.

"Portugal participará no esforço que nós fazemos no âmbito da ONU, da UE e da NATO para garantir proteção a todos aqueles que colaboraram connosco ao longo destes anos e que sintam a sua vida em perigo", afirma o ministro.

O ministro afirma que os países já estão "no plano técnico", depois de várias reuniões, e que a identificação das necessidades mais urgentes já está praticamente garantida.

Santos Silva aproveitou ainda o momento para honrar os dois militares portugueses que perderam a vida durante a campanha realizada no Afeganistão. "Não devemos esquecê-los hoje", sublinhou.

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