Os romanos são conhecidos pelo desenvolvimento do sistema monetário, que incluía o denário, uma pequena moeda de prata que se julga ser a que teria maior circulação no Império Romano. O processo de extração de prata e tratamento para a cunhagem de moedas produzia elevados níveis de poluição por chumbo na atmosfera que chegou à Gronelândia, onde o gelo conservou as marcas dessa contaminação. A observação da evolução desse fenómeno, a par do estudo das alterações na cunhagem de moedas durante o período romano, permitiu concluir que existia já nessa época uma prática de reciclagem.
Uma investigação publicada na revista Archaeological and Anthropological Sciences observou uma redução dos níveis de poluição por chumbo no gelo da Gronelândia na última fase no Império Romano, apesar da cunhagem de moedas não ter sido interrompida.
Várias hipóteses foram levantadas, a começar pelo facto de se ter registado um período de conflitos entre os séculos I e II a.C. que impediu o acesso dos romanos às minas de prata na Península Ibérica e no sul de França.
Estudos anteriores já tinham revelado um declínio no valor do denário ao longo dos anos. Terá sido por volta de 200 a.C. que a pequena moeda de prata foi introduzida no sistema monetário da Roma Antiga.
O estadista, filósofo e escritor romano Marco Túlio Cícero [106-43 a.C.] mencionou numa das suas obras a existência de uma crise financeira, o que ajudou a explicar a descoberta da redução significativa no valor do denário que terá originado uma crise cambial em meados da década de 80 a.C..
Os resultados da análise da composição das moedas permitem constatar as dificuldades financeiras vividas pela Roma Antiga durante esse período, o que levou a um relaxamento dos padrões de exigência da Casa da Moeda.
O denário passou a ter pureza inferior a 95%, que depois caiu para 90%, com algumas moedas a incluírem apenas 86% de prata, o que traduzia a existência de uma grave crise cambial. A moeda que seria a de maior circulação no sistema monetário romano chegou a ter na sua composição entre 5 a 10% de cobre e encontraram-se também outros metais, como o ouro.
Os investigadores da Universidade de Liverpool, Jonathan Wood e Matthew Ponting, concluíram que foi nesta fase que se iniciaram as práticas de reciclagem na cunhagem de moedas no Império Romano.
"Na primeira metade do primeiro século a.C., uma nova infusão de prata com altos níveis de ouro parece entrar em circulação. Dado que Júlio César retornou a Roma após batalhas com os gauleses em 49 a.C., os investigadores sugerem que esta nova prata em circulação foi saqueada pelo exército de César."
"Derreter a prata era uma forma de lidar com as flutuações no fornecimento deste metal precioso. Derreter a prata existente foi a solução encontrada [quer fosse a que já possuíam ou a que foi saqueada]. Para os romanos, reciclar moedas teria sido consideravelmente mais barato do que extrair prata nova – um benefício para as finanças, bem como para o ambiente", explica Jonathan Wood, autor do estudo ‘Crisis? What crisis? Recycling of silver for Roman Republican coinage’ [Crise? Que crise? Reciclagem de prata para cunhagem de moeda no Império Romano], num artigo publicado no site da Universidade de Liverpool.
Essas descobertas realizadas pelo Departamento de Arqueologia Clássica e Egiptologia da Universidade de Liverpool, em parceria com o Departamento de História Clássica e Antiguidade da Universidade de Warwick estão integradas num estudo mais amplo financiado pela União Europeia.
O objetivo desta investigação mais alargada é examinar as estratégias financeiras e monetárias dos estados do Mediterrâneo de 150 a.C. até 64 d.C., com o objetivo de conhecer a composição química de todas as principais moedas de prata daquele período.