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Queda do governo francês: tudo o que precisa de saber sobre a crise política

França mergulhou esta terça-feira numa nova crise política após o chumbo de uma moção de confiança ao governo. François Bayrou é o terceiro primeiro-ministro francês a perder o cargo no espaço de um ano.

Queda do governo francês: tudo o que precisa de saber sobre a crise política
Ajeng Dinar Ulfiana

O Governo francês voltou a mergulhar em mais uma crise política depois de ter sido chumbada uma moção de confiança ao executivo de François Bayrou com 194 votos a favor, 364 votos contra e 15 abstenções.

Desde que iniciou o segundo mandato como Presidente de França, Emmanuel Macron teve cinco primeiros-ministros e prepara-se para nomear mais um já "nos próximos dias".

O que aconteceu?

Pela primeira vez na história da Quinta República, um governo caiu durante uma moção de confiança, segundo a presidente da Assembleia Nacional, Yaël Braun-Pivet, que referiu que dos 589 deputados que compõem a Câmara, 573 estiveram presentes e, destes, 558 votaram. Depois do anúncio do resultado da votação, solicitada pelo próprio Bayrou, este deixou a Assembleia Nacional sem fazer declarações.

O presidente dos deputados do Partido Socialista, Boris Vallaud, falou de um momento "bastante triste" e "bastante grave" na Assembleia Nacional após a queda de François Bayrou, devido à falta de apoio à sua proposta de orçamento do Estado para 2026, em que previa 44 mil milhões de euros de poupanças para reduzir a dívida do país.

Já a presidente dos deputados da França Insubmissa (LFI, esquerda radical), Mathilde Panot, saudou o resultado da votação de confiança, perante a imprensa presente à saída da Assembleia Nacional.

"O senhor Bayrou queria uma hora da verdade, e creio que a teve", afirmou Mathilde Panot, acrescentando que esta terça-feira, o partido apresentará uma moção de destituição contra Macron.

Para a presidente do grupo LFI, o facto de quase dois terços dos deputados terem votado contra a confiança mostra que "a política macronista (...) é minoritária tanto na Assembleia Nacional como no país".

Desde o início do segundo mandato de Emmanuel Macron, em maio de 2022, sucederam-se na liderança do executivo Elisabeth Borne (até janeiro de 2024), Gabriel Attal (até setembro de 2024), Michel Barnier (até dezembro de 2024) e François Bayrou.

O que acontece a seguir?

Bayrou apresentará a sua demissão junto do Presidente Emmanuel Macron esta terça-feira. O chefe de Estado francês teria agora duas opções: escolher um novo primeiro-ministro ou convocar novas eleições, sendo que ambos os cenários colocam França no meio de uma crise política.

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Até agora, Macron resistiu à ideia de convocar eleições antecipadas e parece determinado a manter esse caminho. O Presidente francês disse que nomeará um sucessor para François Bayrou "nos próximos dias".

Será, por isso, decidido um novo primeiro-ministro, possivelmente recorrendo à centro-esquerda. Não existem regras que determinem quem Macron deve escolher, ou com que rapidez. Está tudo nas mãos do chefe de Estado.

Os partidos de extrema-direita Reunião Nacional e de extrema-esquerda querem eleições parlamentares antecipadas, mas também querem a demissão de Macron.

Uma fonte do governo disse na semana passada que o ministro das Finanças, Eric Lombard, o ex-primeiro-ministro socialista Bernard Cazeneuve e o chefe do Tribunal de Contas, Pierre Moscovici - também socialista de longa data - poderão estar na 'lista' de Macron para suceder a François. Outras fontes mencionaram o ministro da Defesa, Sebastien Lecornu.

Crise no parlamento é o único problema?

Não. Além da crise política que se vive dentro do parlamento, França enfrenta ainda um setembro tenso, com vários protestos marcados e crise económica a ditar a atualidade.

No dia 10 de setembro, o movimento popular Bloquons Tout (“Vamos bloquear tudo”), que cresceu nas redes sociais, planeia protestos em todo o país. Dois dias depois, no dia 12 de setembro, a Fitch Ratings revê a classificação de crédito em França, o que determinará um agravamento ou não da crise económica.

Já no dia 18 de setembro, os sindicatos deverão realizar greves e protestos.

Como se chegou até aqui?

Desde que Emmanuel Macron arriscou em 2024 convocar eleições antecipadas, que o tecido político francês se tornou particularmente fragmentado. O controlo de Macron sobre o parlamento enfraqueceu à medida que a dívida de França aumentou.

Na base da crise está assim o estado das finanças públicas. A despesa pública francesa em percentagem do PIB é a maior entre as principais economias mundiais. E com falta de receitas para cobrir gastos de tão elevada dimensão, França acumula um dos maiores défices públicos anuais em todo o mundo.

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A somar a isto, os juros que a França paga nos mercados internacionais já são mais elevados do que os cobrados à Grécia e a Itália, por exemplo.

A produtividade também já viu dias melhores e está agora substancialmente abaixo da média da UE e da OCDE.

Perante isto, o executivo de Bayrou apresentou a proposta de orçamento para 2026 que prevê cortar 44 mil milhões de euros em despesa pública e aumentar a produtividade. Medidas que incluíam acabar com dois feriados e congelar reformas por um ano.

Estas ideias foram rejeitadas pela oposição. Incapaz de recuar, Bayrou convocou um moção de confiança na sua estratégia fiscal, numa aposta que a oposição chamou de suicídio político.


Com Lusa