O Ministério Público quer afastar José Sócrates da posição de assistente no processo EDP, mas o antigo primeiro-ministro contesta e afirma que o seu "compromisso" é "estar atento ao cumprimento da legalidade", "não deixar que se confunda direito com maledicência" e "justiça com campanhas políticas de difamação".
Num comunicado enviado às redações, Sócrates critica os procuradores por "insistirem" em afastá-lo do processo, propondo "mais uma vez" que fosse "recusado o estatuto de assistente". O Ministério Público considera que o ex-governante está a ajudar a defesa do antigo ministro da Economia, Manuel Pinho e, por isso, avançou com este pedido.
No despacho que a SIC teve acesso, o procurador do Ministério Público escreve que foram detetadas, no espaço de oito meses, 115 comunicações entre os dois, para além existirem fotografias de encontros na casa onde Pinho está em prisão domiciliária.
O Ministério Público considera que "não faz qualquer sentido que José Sócrates, amigo pessoal e frequentador da casa de Manuel Pinho, tenha o estatuto de assistente".
José Sócrates já tinha garantido à SIC que é assistente para repor a verdade dos factos e que irá contestar este pedido. Em comunicado, recorda as duas razões que o levaram a requer a condição.
"A primeira e mais importante tem a ver com a investigação da grave suspeita comunicada pelo Ministério Público Brasileiro a propósito de importâncias pagas pela empresa Odebrecht ao assessor de comunicação brasileiro da campanha do PSD de 2015", refere José Sócrates, continuando o tom crítico ao Ministério Público (MP): "Teme que alguém lhe recorde o seu dever de investigar a suspeita de uso de dinheiro sujo na campanha do PSD de 2015".
O antigo primeiro-ministro entende que esta "é a verdadeira razão pela qual o Ministério Público o quer afastar do processo", considerando que "como é o PSD, como se trata de Passos Coelho, e como o Ministério Público não quer, o silêncio sobre o assunto é quase completo".
"Imaginemos, por um momento, que a campanha em vez de ser a de 2015 era a de 2005 e que o primeiro-ministro em questão não se chamava Passos Coelho, mas José Sócrates. Nesse caso, julgo que é incontroverso afirmar que teríamos tido horas e horas de reportagens televisivas sobre tal suspeita."
Por outro lado, Sócrates defende a sua condição de assistente em nome da "verdade dos factos relativos à alegação de favorecimento da EDP" pelo seu Governo (foi primeiro-ministro entre 2005 e 2011), acusando o MP de orquestrar "uma das mais odiosas e repugnantes campanhas de difamação" e saindo em defesa do seu antigo ministro da Economia Manuel Pinho.
"Acontece que acusação é falsa, injusta e injuriosa. Em primeiro lugar, e no que tem a ver com CMECS, é hoje irrefutável que eles foram aprovados nos Governos de Durão Barroso e de Santana Lopes e não pelo Governo em que Manuel Pinho exerceu funções", recusando a existência de leilão nas barragens e invocando um relatório da Comissão Europeia que indica que as avaliações do Estado para o cálculo do valor a pagar pela EDP “foram feitas com base em metodologias adequadas.”
Além de identificar "vingança e retaliação" como as motivações dos procuradores e de expressar a expectativa de abertura de um inquérito pela Procuradora-Geral da República à denúncia feita por Manuel Pinho de alegadas considerações homofóbicas por um dos procuradores, José Sócrates exige que a investigação se traduza em provas e numa acusação.
"Ao fim de doze anos de inquérito o dever dos procuradores, se não perderam ainda todo o sentido de decência, é apresentar as provas. As provas que disseram que tinham. As provas que afirmaram que existiam. As provas esmagadoras que apregoaram durante anos e anos. Apresentem as provas que o Governo favoreceu a EDP."
A investigação tem de facto mais de uma década, com Manuel Pinho a ser suspeito de corrupção e branqueamento de capitais, mas sem ter havido ainda qualquer acusação.
Manuel Pinho foi constituído arguido no verão de 2017, por suspeitas de corrupção e branqueamento de capitais, num processo relacionado com dinheiros provenientes do Grupo Espírito Santo.
No processo EDP/CMEC, o MP imputa aos antigos administradores António Mexia e Manso Neto, em coautoria, quatro crimes de corrupção ativa e um crime de participação económica em negócio.
O processo tem ainda como arguidos João Conceição, administrador da REN e antigo consultor de Manuel Pinho, e Artur Trindade, ex-secretário de Estado da Energia de um Governo PSD.