Quem quiser saber que é feito do argumentista que escreveu "Taxi Driver" (1976), para o realizador Martin Scorsese, e dirigiu filmes como "American Gigolo" (1980) ou "Mishima" (1985), tem agora a hipótese de actualizar o seu conhecimento — aos 77 anos de idade, Paul Schrader continua em plena e frutuosa actividade. Assim, chegou recentemente às salas o seu filme "O Mestre Jardineiro", um requintado estudo de uma personagem assombrada por um passado tenebroso, com Joel Edgerton e e Sigourney Weaver nos papéis principais [ver trailer aqui em baixo] .
Mas importa ir um pouco mais além e lembrar que Schrader, sendo autor de muitos argumentos (dos seus filmes e de mais alguns títulos de Scorsese, incluindo "O Touro Enraivecido" e "A Última Tentação de Cristo", respectivamente de 1980 e 1988), é também um escritor multifacetado. Consultando o seu site oficial, podemos encontrar uma lista de muitos ensaios que assinou ao longo das décadas, duas peças de teatro e um livro que é, afinal, um clássico absoluto na história dos estudos sobre cinema.
O título desse livro define, por si só, todo um programa: "O Estilo Transcendental no Cinema". Que é como quem diz: uma abordagem de obras que procuram dar a ver ou, pelo menos, pressentir aquilo que, na experiência humana, transcende, de facto, os dados correntes do quotidiano. O subtítulo é esclarecedor, identificando os clássicos que Schrader convoca para a sua análise: "Ozu, Bresson, Dreyer", ou seja, um mestre japonês, outro francês e ainda um dinamarquês.
Pois bem, "O Estilo Transcendental no Cinema" teve a sua primeira edição em 1972, vindo a ser reeditado em 2018, com uma nova introdução — é esta versão actualizada que pode ser descoberta ou redescoberta em excelente tradução portuguesa, assinada por Salvato Teles de Menezes e Vasco Teles de Menezes (Edições 70).
Através de referências emblemáticas de Yasujiro Ozu, Robert Bresson e Carl Th. Dreyer (por exemplo, respectivamente, "Viagem a Tóquio", "Pickpocket" e "A Palavra"), Schrader reflecte sobre aquele que é, afinal, o enigma mais fascinante da arte cinematográfica, quer para os seus criadores, quer para os espectadores: como é que uma linguagem do visível, isto é, das imagens pode exprimir a dimensão invisível (transcendental, como ele diz) dos seres humanos? Enfim, um livro com mais de meio século cuja actualidade temática e riqueza de pensamento o tempo não anulou.