No despacho que enviou para o Supremo Tribunal de Justiça, a que o Expresso teve acesso, Gabriela Assunção, juíza de instrução criminal, considera que o Presidente da República não teve um comportamento "neutro" e que devia ser investigado no caso das gémeas que foram tratadas no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, com medicamentos que custaram quatro milhões de euros.
No documento judicial consultado pelo Expresso, a magistrada refere que é "descrita pelo Ministério Público (MP) a prática de atos, atribuíveis a Sua Excelência, o Senhor Presidente da República que não são neutros em relação aos atos imputados aos suspeitos". Entende-se, por isso, que a juíza acredita que o Presidente da República estaria em condições de ser investigado por coautoria no crime de prevaricação.
Crime esse imputado pelo MP a Nuno Rebelo de Sousa, filho de Marcelo, "que não tem a qualidade de ser titular de cargo político e que nunca poderia intervir no exercício das suas funções".
Gabriela Assunção atira críticas ao Ministério Público por não ter "levado a cabo (...) qualquer enquadramento jurídico quanto à atuação de (...) Marcelo Rebelo de Sousa", sustentando que, apesar de Marcelo "não ter a mesma competência e âmbito de atuação (...) que teria o suspeito António Lacerda Sales (...), não se vislumbra como é que se pode não ponderar, ainda que abstratamente, a convocação do artigo 28º do Código Penal também para a atuação que o Ministério Público descreve e imputa ao Presidente da República, como fez quanto ao suspeito Nuno Rebelo de Sousa", lê-se no documento citado pelo semanário.
No entanto, esta posição da magistrada, posteriormente enviada para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), não foi apoiada pelo conselheiro Celso Manata, que recusou o requerimento da juíza argumentando que o Ministério Público "é o titular da ação penal, sendo ao mesmo que cabe iniciar procedimentos criminais e promover as diligências para o efeito pertinentes".
Também numa resposta enviada ao STJ, o MP frisou que o Presidente da República não é suspeito de ter cometido qualquer crime e que só os procuradores devem decidir se deve ou não ser investigado.
O filho do Presidente da República é arguido por prevaricação, assim como Lacerda Sales, antigo secretário de Estado da Saúde e Luís Pinheiro, ex-diretor clínico do Hospital de Santa Maria. Os pais das crianças luso-brasileiras são suspeitos de burla por conta da atribuição de nacionalidade portuguesa às filhas para poderem receber o tratamento para a atrofia muscular espinal.