Às primeiras horas da manhã de 26 de abril de 1986, o núcleo do reator 4 da central nuclear de Chernobyl na Ucrânia da era soviética entrou em fusão e explodiu, causando o pior desastre nuclear da História. Os efeitos fizeram-se, e ainda se fazem e farão sentir-se durante longos anos e a vários níveis: ambientais, sanitários ou políticos. Mas também turísticos e económicos.
Trinta e cinco anos depois, ainda não são mensuráveis as consequências deste acidente sem precedentes.
Os números oficiais de mortos continuam a ser 31 - aqueles que morreram naquela noite, dois funcionários da central e bombeiros. Mas a nuvem radioativa que se espalhou foi contaminando uma grande parte da Europa de leste e central, tendo a Ucrânia, a Bielorússia e a Rússia sido os países mais fortemente atingidos. A radioatividade chegou a ser detetada na Irlanda.
Estimam-se milhares de mortos em consequência da radiação - entre 4 mil e 90 mil.
Atualmente vivem 5 milhões de pessoas em zonas contaminadas pela radioatividade. Os efeitos na sua saúde estão longe de estarem totalmente determinados.
Polémicas sobre as consequências
As consequências reais do desastre de Chernobyl em grande parte continuam a não ser reconhecidas e até são subestimadas.
Os danos imediatos causados pela explosão não foram nada comparados com as consequências a longo prazo, tanto em termos de custos humanos quanto políticos, como as altas taxas de cancro registadas nas áreas vizinhas nos anos seguintes ao desastre. O então Presidente soviético Mikhail Gorbachev afirmou mais tarde que foi o desastre de Chernobyl, mais do que qualquer outro fator, que causou a queda da União Soviética.
A um nível internacional, a crise de credibilidade que afeta a energia nuclear foi desencadeada pelo acidente de Chernobyl. Mas outro acidente 26 anos depois poderá ter tido maior maior impacto para essa rejeição: o desastre nuclear na central japonesa de Fukushima Daiichi, na sequência de uma terramoto e tsunami.
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Consequências ambientais
O acidente libertou pelo menos 100 vezes mais radiação do que as bombas atómicas lançadas sobre Nagasaki e Hiroshima na II Guerra Mundial.
Uma "nuvem" composta de elementos radioativos (iodo-131, césio-134 e césio-137) escapou do local nos dez dias seguintes, que, empurrada pelos ventos, contamina grande parte da Europa.
Grande parte da "chuva radioativa" caiu na Ucrânia, Bielorrússia e Rússia. Mais de 350.000 pessoas foram retiradas das imadiações da central, mas cerca de 5,5 milhões permanecem.
A contaminação com césio e estrôncio é uma das grandes preocupações, pois estes elementos químicos permancerão no solo durante muitos e longos anos.
Após o acidente, vestígios de depósitos radioativos foram encontrados em quase todos os países do hemisfério norte. Mas o vento e as chuvas irregulares deixaram até algumas áreas mais contaminadas do que as contíguas. A Escandinávia foi gravemente afetada e ainda existem áreas do Reino Unido onde as quintas têm de fazer controlos regulares, assim como em França, e são apenas exemplos na Europa.
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Consequências sociais e sanitárias
♦ Realojamento das populações e zona de exclusão
A evacuação de Pripyat e arredores só foi ordenada 36 horas após o acidente. Cerca de 50 mil pessoas foram retiradas de Pripyat, incluindo 17 mil crianças, e transportadas em centenas de autocarros para uma zona segura. Na altura foi-lhes dito que a evacuação duraria apenas três dias, mas a maioria nunca mais voltou a casa.
Nas semanas e meses a seguir, mais 67 mil pessoas foram levadas das áreas contaminadas. No total, estima-se que cerca de 200 mil pessoas tenham sido deslocadas.
Foi determinada uma zona de exclusão de 2.600 km2.
Embora ainda seja ilegal morar na zona de exclusão de 30 km2, muitas pessoas quiseram regressar às suas casas. Estima-se que 130 a 150 pessoas vivam lá - muitas das quais ainda cultivam as terras de suas famílias.
Trinta anos depois do acidente, os repórteres da SIC Sofia Arêde e Carlos Gabriel Catarino.revisitaram uma das maiores tragédias da História. "As vozes de Chernobyl" foi emitido a 10 de junho de 2016.
♦ Radioatividade, doenças e número de mortos
O número de pessoas que podem morrer como resultado do acidente de Chernobyl é altamente controverso.
O Fórum de Chernobyl liderado pela ONU diz que pelo menos 9 mil vão morrer com cancro. Mas diz que os problemas da maioria das pessoas são "económicos e psicológicos, não de saúde ou ambientais".
Um relatório da ONU de 2005 estimou que o número de mortes até ao momento e futuras era de 4 mil nos três países mais afetados.
O Greenpeace está entre aqueles que prevêem efeitos mais sérios para a saúde com uma previsão de pelo menos 93 mil mortes devido a cancro mas outras doenças levarão a vida de mais 200 mil pessoas.
Por sua vez, as autoridades ucranianas relataram em 1998 cerca de 12.500 mortes.
O impacto mais óbvio na saúde é um aumento acentuado do cancro da tiroide. À época do acidente foram obervados cerca de 4 mil casos da doença, principalmente em crianças e adolescentes. Mas o Greenpeace diz que pode haver 60 mil casos da doença, entre 270 mil casos de todos os tipos de cancro.
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Sarcófago e desmatelamento do reator danificado
O sarcófago de betão que envolveu o reator 4 Chernobyl num primeiro momento foi construído à pressa como uma solução temporária, mas só 25 anos depois foi substituído por uma construção de aço mais resistente, projetada para durar 100 anos. Apesar disso, ainda há um aceso debate sobre a sua eficácia e o seu futuro.
O abrigo permite a desmontagem da estrutura de cimento e o tratamento do combustível radioativo e do reator danificado.
A central nuclear de Chernobyl só foi definitivamente encerrada em dezembro de 2000, 14 anos após o acidente.

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Consequências políticas
A catástrofe de Chernobyl é um marco importante no início do declínio da União Soviética. O então sexretário-geral do Partido Comunista soviético Mikhail Gorbachev disse que Chernobyl foi a principal causa da queda da União Soviética em 1991.
Moscovo demorou a admitir o que tinha acontecido, mesmo quando níveis cada vez mais elevados de radiação eram detetados noutros países.
O primeiro alerta público foi dado a 28 de abril de 1986 pela Suécia, que detectou um aumento da radioatividade no seu território. A AIEA (Agência Internacional de Energia Atómica) recebeu a notificação oficial do acidente a 30 de abril. Mas o líder soviético, Mikhail Gorbachev, só o admitirá publicamente a 14 de maio.
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Consequências económicas
O custo para resolver o desastre quase arruinou a União Soviética. A contenção e descontaminação imediatas do local e das áreas em volta custou cerca de 237,8 mil milhões de dólares.
Outro impacto económico significativo na altura foi a remoção de 784.320 hectares de terras agrícolas e 694.200 hectares de floresta. Os custos da produção agrícola aumentaram devido à necessidade de técnicas especiais de cultivo, fertilizantes e aditivos, consequências que tiveram impacto nos três países mais atingidos.
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Regresso surpreendente da vida selvagem
A área em redor de Chernobyl tornou-se uma floresta vermelha, por causa das árvores mortas. Imediatamente após a explosão esta área recebeu as maiores doses de radiação, os pinheiros morreram instantaneamente e todas as folhas ficaram vermelhas. Poucos animais sobreviveram aos níveis altos de radiação.
Assim, após o acidente presumiu-se que a área se tornaria um deserto para sempre, considerando o longo tempo que alguns compostos radioativos levam para se decompor e desaparecer do meio ambiente.
Apesar da contaminação da área, os cientistas ficaram surpreendidos com o renascimento de vida selvagem. As populações de cavalos selvagens, javalis e lobos prosperaram, enquanto os linces regressaram e os pássaros fizeram ninhos no prédio do reator sem que tenham sido detetados quaisquer efeitos nocivos da radiação na sua saúde.
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Turismo macabro numa cidade fantasma
A zona de exclusão pode atualmente ser visitada e o turismo aumentou recentemente em cerca de 40% devido à série Chernobyl da HBO. Em 2019, visitaram a área de Pripyat cerca de 120 mil pessoas.
Nesse ano, o Presidente ucraniano assinou um decreto que permite o desenvolvimento do território iniciando "a transformação da zona de exclusão de Chernobyl num dos pontos de crescimento da nova Ucrânia. Primeiro que tudo, vamos criar um 'corredor verde' para os turistas e eliminar assim as transgressões dos curiosos”.
Entre as "atrações" é possível visitar uma cantina escolar cheia de máscaras de gás e um parque de diversões abandonado em Pripyat.
A ambição da classificação da UNESCO
A Ucrânia iniciou entretanto o processo para eventualmente solicitar a classificação como património mundial da UNESCO da central nuclear desativada, dos terrenos baldios, dos escombros e dos prédios abandonados, na esperança de que tal atribuição signifique mais financiamento e mais turistas.