A Jornada Mundial da Juventude de Lisboa será a minha terceira. Tive a sorte de ter estado em 2016 na Polónia e em 2019 no Panamá.
O nome de Éder poderá ter feito concorrência ao de Francisco
Com 18 anos, em Cracóvia, a recordação maior que tenho é a chuva. Na volta, sendo verão, até pode não ter chovido praticamente, mas é essa a memória-chave que insiste em mim permanecer. Na minha cabeça recordo-me sempre dos casacos que suponho ter usado na maior parte dos dias e das poças de água que pisei no leste da Europa.
Éramos campeões europeus e não podíamos estar mais felizes. Pelas ruas polacas, entre tantas nacionalidades (incluindo franceses), cantámos vezes sem conta o “Pouco importa, Pouco importa, Se jogamos bem ou mal, Queremos é levar a Taça, Para o nosso Portugal”.
O nome de Éder, homem-golo na final de Paris, poderá mesmo ter feito concorrência ao de Francisco no número de ocorrências nas bocas portuguesas por esses dias.
“Jogávamos futebol para aquecer e enfrentar o banho frio que nos esperava”
Partimos de Lisboa num autocarro que demorou dois dias a chegar ao destino. Pelo meio, muitos filmes, orações e tantas conversas com os amigos que nos rodeavam. Saímos da terra lusa carregados de energia e à terra de João Paulo II chegámos como se há cinco minutos tivéssemos saído de casa. A euforia era grande. E fez-se ouvir nos elétricos que apanhámos ao longo de toda a semana.
Dormíamos numa escola, distribuídos entre salas e ginásios, e de manhã, entre rapazes, jogávamos futebol para aquecer e enfrentar o banho frio que nos esperava – tão eficiente na carga que nos atribuía para as atividades do dia-a-dia.
O Papa vi-o ao longe, no Campo da Misericórdia, no alto do altar-palco dos últimos dias da Jornada. Estava do lado esquerdo e conseguia ver um ponto branco que se movia. Estava distante, mas era-nos simultaneamente próximo. Os ecrãs gigantes também ajudavam a ver as expressões do Santo Padre.
Éramos um grupo grande, mais de 100 certamente, que nos tínhamos inscrito em conjunto. Talvez por isso não me recorde de longas conversas com peregrinos de outras nacionalidades que não a portuguesa. Mas lembro-me de rezar e cantar em conjunto. E lembro-me de uma maré de gente sem fim que horas infinitas caminhava para chegar aos locais dos eventos. Sempre com uma tremenda alegria e vontade de lá querer estar. De ser parte daquela semana em comunhão com Francisco.
No regresso à outra ponta da Europa passámos por Paris e vimos a Torre Eiffel. Brilhava na noite francesa e não poderia ter havido melhor remate da caminhada nessa JMJ. Uma forte mescla entre a religião e a cultura.
Do frio de Lisboa para o calor abrasador da Cidade do Panamá
Aos 20 anos de idade, entre os exames de janeiro na Faculdade de Direito, tive a honra de atravessar não a Europa mas o Mundo atrás do Papa. Do frio de Lisboa passei para o calor abrasador da Cidade do Panamá.
Depois de uma escala em Nova Iorque, seguimos para a América Central. Dos bairros mais pobres aos arranha-céus, o Panamá conquistou-nos. Éramos um grupo bem mais pequeno. Rondávamos os 10 membros.
Jogámos, descalços, futebol nas ruas e, depois de muito caminhar, tirámos fotografias com os gigantes prédios luminosos como pano de fundo. As pessoas tratavam-nos tão bem. Desde os cafés e restaurantes àqueles que nos acolheram em sua casa.
A casa onde ficámos estava desabitada, mas estava impecável. Apesar de não ter praticamente qualquer mobília, nada nos faltou. Tínhamos casa-de-banho, comida de todos os tipos deixada pelos donos para nosso bel-prazer e que bem que dormíamos nos sacos-cama. Quando chegávamos a horas minimamente decentes ainda nos banhávamos na piscina do condomínio.
A família estava em permanente contacto connosco, sempre atenta ao que pudéssemos necessitar. Num dos dias convidou-nos para jantar em sua casa (a que habitavam). Entre fados e cante alentejano partilhámos culturas e saboreámos a globalização.
Francisco pelas ruas do Panamá
Vimos o Canal do Panamá e vimos o Papa de tão perto. A primeira vez no meio da rua. Peregrinos de todas as nacionalidades preenchiam as avenidas e saudavam Francisco, que ali se apresentava, em passo lento, no PapaMóvel. Um bebé foi pelo Papa ali abençoado – mesmo à frente dos meus olhos. Francisco parece ter esse dom. Descobre rostos no meio de um bloco de multidão.
A Vigília é dos momentos mais fortes da JMJ. O cair da noite contribui para o misticismo associado à oração e, por vezes, faz-se silêncio. Milhares em silêncio arrepiam qualquer alma. Reavivo um olhar em redor absolutamente deslumbrante.
Até ao nascer-do-sol há quem durma no chão aguardando pelo Papa no presidir da Missa Final. E há quem converse, cante e dance noite fora. Não parece haver uma opção certa, todas parecem válidas dada a intensidade do momento.
Com o sol já no céu Francisco voltou a surgir. E nós estávamos no palco. Talvez por se antever que a próxima Jornada seguiria para Lisboa quisessem garantir portugueses ali bem perto. Atrás estava o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que tantas vezes encontrámos durante o evento.
Terminava a missa e chegava a confirmação. Fazia-se a festa entre os lusos. Portugal iria receber a JMJ. Um evento, um dos maiores de todo o mundo, que não é claramente só para jovens. É também para famílias, homens e mulheres feitos, e altera todo o país que o recebe.