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Balanço oficial confirma 149 mortos no Egito, recolher obrigatório em 14 províncias

A vaga de violência hoje registada no Egito,  motivada pela repressão dos acampamentos de protesto dos apoiantes do Presidente  deposto Mohamed Morsi, fez 149 mortos em todo o país, segundo um novo balanço  oficial. 

Manu Brabo

Um porta-voz do Ministério da Saúde egípcio, Mohamed Fathala, afirmou,  em declarações à agência estatal egípcia Mena, que os confrontos registados  em várias províncias do país também fizeram pelo menos 1.403 feridos. 

O representante indicou que só no Cairo foram verificadas pelo menos  49 vítimas mortais. O anterior balanço do ministério dava conta de 95 mortos  e 874 feridos. 

O novo balanço foi divulgado num momento em que centenas de apoiantes  de Morsi deixaram a praça Rabaa al-Adawiya, o seu último bastião no Cairo.

Mas os números indicados por outras fontes no terreno revelam um cenário  mais dramático. 

Na praça Rabaa al-Adawiya, um jornalista da agência France Press relata  que contou 124 cadáveres nas três morgues improvisadas no local. 

A trabalhar igualmente no terreno, o operador de câmara da estação britânica  Sky News Mick Deane, de 61 anos, também perdeu a vida nos confrontos. 

A polícia egípcia cumpriu hoje as ameaças dos últimos dias e dispersou  violentamente os apoiantes de Morsi, apoiado pela Irmandade Muçulmana, concentrados  em praças da capital egípcia. 

O atual clima de tensão no Egito iniciou-se a 30 de junho, quando diversos  setores da oposição promoveram grandes protestos exigindo a deposição de  Morsi, eleito em junho de 2012 nas primeiras eleições livres no país. 

Em 3 de julho, o Presidente foi deposto e detido pelos militares, tendo  sido formado um Governo de transição, entre os protestos das correntes islamitas  que exigem o seu regresso ao poder.  

Após o falhanço das tentativas de mediação internacionais, o Governo  interino nomeado pelo exército anunciou que, terminado o período do Ramadão,  no passado fim de semana, iria acabar com as manifestações pró-Morsi, operação  que iniciou hoje. 

A operação transformou-se num "banho de sangue" e desencadeou uma vaga  de violência em outras regiões egípcias, como foi o caso de Alexandria,  no norte do Egito. 

Apoiantes da Irmandade Muçulmana atacaram a Biblioteca de Alexandria  e tentaram invadir a esquadra de polícia da zona de Burg al Arab, também  naquela cidade. 

Perante o "perigo" que ameaça "a segurança e a ordem nos territórios  do país", a presidência interina egípcia declarou estado de emergência em  todo o país, medida que estará em vigor durante um mês. 

"A segurança e a ordem na nação estão em perigo devido aos atos de sabotagem  deliberados, ataques que visam edifícios públicos e privados e a perda de  vidas humanas, atos perpetrados por grupos extremistas", sublinhou um comunicado  da presidência egípcia, divulgado pela televisão estatal. 

Momentos depois, o governo interino impôs um recolher obrigatório no  Cairo e em outras 13 províncias do território. O recolher será imposto entre  as 19:00 locais (18:00 hora de Lisboa) e as 06:00 locais (05:00 hora de  Lisboa). 

Os confrontos também já fizeram uma baixa política. O vice-presidente  egípcio Mohamed El Baradei, com a tutela das relações exteriores, apresentou  a sua demissão. 

"Apresento a minha demissão do cargo de vice-presidente e peço a Deus,  o altíssimo, que guarde o nosso querido Egito de todo o mal e que cumpra  as esperanças e as aspirações do povo", escreveu o Nobel da Paz (2005),  numa carta dirigida ao Presidente egípcio interino, Adly Mansour.  

"Tornou-se difícil continuar a assumir a responsabilidade por decisões  com as quais não estou de acordo", referiu ElBaradei na missiva. 

As reações internacionais à situação no Egito foram marcadas por palavras  como "condenação" e "moderação", como foi o caso do Reino Unido, França  e Alemanha. 

"Condeno o uso da força para dispersar manifestantes e apelo às forças  de segurança para agirem com moderação", declarou o chefe da diplomacia  britânica, William Hague, afirmando-se "profundamente preocupado com a escalada  da violência no Egito". 

Também o ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, Guido Westerwelle,  apelou a todas as forças políticas" no Egito para "impedirem uma escalada  da violência". 

A Turquia e o Irão também condenaram a ação das forças de segurança  egípcias, com o Governo turco a exortar a comunidade internacional a pôr  fim a este "massacre". 

"A comunidade internacional, com o Conselho de Segurança da ONU e a  Liga Árabe na primeira linha, devem passar de imediato à ação para cessar  este massacre", referiu um comunicado divulgado pelo serviço de imprensa  do primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan.  

O regime de Teerão considerou os acontecimentos do Cairo como "um massacre",  advertindo para as "graves consequências" destes acontecimentos. 

"O Irão segue de perto os acontecimentos dolorosos no Egito, desaprova  as ações violentas, condena o massacre da população e adverte para as suas  graves consequências", segundo indicou um comunicado da diplomacia iraniana.

A situação egípcia foi condenada igualmente por Washington, que manifestou-se  contra a imposição do estado de emergência no território egípcio. 

"Os Estados Unidos condenam com veemência o recurso à violência contra  os manifestantes no Egito", declarou o porta-voz adjunto da Casa Branca,  Josh Earnest, exortando os militares a mostrarem moderação. 

Apelando à reconciliação nacional "genuinamente inclusiva", o secretário-geral  da ONU, Ban Ki-moon, lamentou que as autoridades egípcias "tenham optado  por usar a força para responder às manifestações". 

Do lado da União Europeia (UE), a chefe da diplomacia europeia, Catherine  Ashton, lamentou "a perda de vidas", pedindo "às forças de segurança uma  maior contenção e a todos os cidadãos egípcios que evitem mais provocações  e uma escalada". 

O secretário-geral da NATO, Anders Gogh Rasmussen, pediu igualmente  a todas as partes que se abstenham do uso da violência e trabalhem para  restabelecer o processo político no país. 

Lusa