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Moções de Mariana Mortágua e Pedro Soares lutam pela liderança do Bloco de Esquerda

Catarina Martins sai de cena e só há uma vaga para as duas moções apresentadas. A moção A de Mariana Mortágua e a moção E de Pedro Soares enfrentam-se na Convenção Nacional do Bloco de Esquerda este fim de semana. Conheça as suas propostas para o futuro do país.

Moções de Mariana Mortágua e Pedro Soares lutam pela liderança do Bloco de Esquerda
SIC Notícias

O BE elege este fim de semana a sua nova liderança, numa Convenção Nacional que será a despedida de Catarina Martins após uma década, estando em debate duas moções, a de Mariana Mortágua e a de Pedro Soares.

Sob o lema, "Levar o país a sério", a XIII Convenção Nacional do BE regressa este sábado e domingo ao pavilhão do Casal Vistoso, em Lisboa, onde 654 delegados vão discutir a orientação política do partido e decidir quem vai assumir os destinos dos bloquistas após a saída de Catarina Martins.

Os bloquistas iniciarão assim um novo ciclo de liderança, numa altura em que enfrentam o desafio de uma bancada parlamentar reduzida depois dos maus resultados das legislativas antecipadas de 2022, que encolheu o financiamento do partido e obrigou a alterações na estrutura partidária.

Precisamente para fazer face a esta situação, o BE lançou no início de março uma campanha de angariação de fundos para financiar os trabalhos desta convenção, que traçou como objetivo aumentar o autofinanciamento e reduzir a dependência em relação ao financiamento público, tendo angariado, segundo a página doar.bloco.org, pouco mais de sete mil euros dos 80 mil pretendidos, ou seja, menos de 10%.

Para além das questões internas, as intervenções durante o fim de semana não deverão esquecer as críticas à maioria absoluta do PS e à atual crise política.

As duas moções na luta

Ao contrário de outras reuniões magnas, em que havia mais moções em discussão, desta vez são apenas duas as que serão debatidas e votadas pelos delegados à convenção, para além de oito plataformas.

Subscrita por diferentes nomes da atual direção, incluindo a própria Catarina Martins, surge a moção A, intitulada "Uma força, muitas lutas" e encabeçada pela deputada Mariana Mortágua e que, uma vez que conseguiu eleger 81% dos delegados que irão votar, deverá sair vencedora desta convenção.

"Uma vida boa para todas as pessoas, sem exceção" é aquilo que move a moção de Mariana Mortágua, que promete que "o Bloco de Esquerda será a mais forte oposição ao Governo" e o PS criticado por ter encontrado "no crescimento do Chega a fórmula eleitoral para tentar salvar a sua maioria absoluta" uma vez que não consegue "oferecer soluções mobilizadoras".

A moção A "Uma força, muitas lutas", da deputada Mariana Mortágua, está dividida num total de 55 pontos e conseguiu eleger a maioria dos delegados à convenção: 530

Em debate estará ainda a moção E, sob o lema "Um Bloco plural para uma alternativa de esquerda - um desafio que podemos vencer!", que terá como porta-voz à convenção o ex-deputado Pedro Soares, crítico da atual direção.

Os críticos defendem que é "preciso resgatar a ideia génese do Bloco" e apontam a ausência de balanço do "ciclo de perdas eleitorais e de diminuição de influência social", considerando que a "campanha centrada no objetivo da repetição de um acordo com o PS foi um dos fatores de derrota" nas eleições de 2022.

A moção subscrita pelo antigo deputado Pedro Soares, moção E " conta com 40 pontos e elegeu 89 delegados.

Mas o que propõem, ao certo, ambas as moções?

Organização interna do partido e liderança

MOÇÃO A

  • A coordenação da Comissão Política ficará a cargo de quem encabece a lista mais votada para a Mesa Nacional do Bloco de Esquerda.
  • Propõe-se o reforço do autofinanciamento do partido (quotas e iniciativas), reconhecendo-se que "é uma mudança de cultura interna que deve aprofundar-se".

MOÇÃO E

  • Criação da figura de porta-vozes "democraticamente legitimados pelos/as aderentes e nas diversas escalas de intervenção (local, regional e nacional)"
  • Rejeição da "aclamação antecipada de líderes" e definição coletiva de critérios e criticam-se as "perseguições internas por delito de opinião", rejeitando “o fechamento e a autossuficiência centralista”
  • Rejeição da"estereotipada transmissão de propaganda formatada e de 'cima para baixo'".

Linha de atuação futura

MOÇÃO A

  • Tornar o Bloco de Esquerda "a mais forte oposição ao Governo" e continuar a procurar convergências políticas à esquerda", com a “ambição de erguer um amplo campo de esquerda popular que mude a relação de forças a favor de quem trabalha”
  • Reforçar o apoio do Bloco a movimentos pelos direitos sociais e humanos e reforçar as iniciativas dirigidas à juventude.

MOÇÃO E

  • Redefinição da orientação política com "autonomia tática e estratégica".
  • Critica o discurso da direção anterior que tem sido marcado "pela superficialidade, gerido em função da possibilidade de entendimentos parlamentares com incidências governativas".

As razões para os resultados nas últimas eleições

MOÇÃO A

Não há referências diretas aos resultados eleitorais de 2022, que deram maioria absoluta ao PS, e em que o BE viu o seu grupo parlamentar reduzido de 19 para cinco deputados.

MOÇÃO E

  • Exige-se um "balanço profundo dos últimos anos" e “tirar lições das derrotas”
  • Pedro Soares, antigo deputado, critica "a ênfase parlamentar quase exclusiva como centro da iniciativa política, a secundarização das lutas populares e até o afastamento de combates laborais".

Próximos desafios eleitorais

MOÇÃO A

  • Nas "eleições para as assembleias legislativas das regiões autónomas dos Açores e da Madeira, o Bloco é a alternativa autonómica solidária à coligação de interesses de todas as direitas e ao imobilismo do PS".
  • Compromisso para aprofundar a formação dos ativistas do partido e a coordenação do trabalho a nível local
  • Na preparação das eleições autárquicas de 2025, o Bloco promoverá debates alargados sobre a intervenção do partido nas autarquias

MOÇÃO E

  • No que toca às eleições regionais da Madeira,"irão ter a importância específica da procura do restabelecimento da representação parlamentar bloquista, perdida em 2019, e por poderem marcar o ciclo, nomeadamente no combate à extrema-direita"
  • Defende que “as autonomias, tanto da Madeira como dos Açores, serão determinantes na definição da orientação política do Bloco e devem contar com o forte empenho do todo bloquista”
  • Quanto às autárquicas, dar às organizações locais do partido “capacidade para avançar com candidaturas autárquicas, candidatas/os e programas eleitorais locais”

Propostas para o país

MOÇÃO A

  • "Reforma estrutural das relações laborais e da legislação" nesta área e, na habitação, sugere-se um levantamento, a nível municipal, de todas as casas devolutas
  • Reorganização e alargamento dos serviços públicos, e destaca-se uma proposta para “um Serviço Nacional de Cuidados - rede pública de creches, lares, apoio domiciliário e outros serviços especializados - que garanta que o acesso a cuidados é independente da esfera familiar e da condição financeira de cada um”
  • Mais transparência, com a "separação entre a política e os negócios", e um “sistema de justiça célere e acessível”
  • Compromisso com lutas por justiça climática e bem-estar animal

MOÇÃO E

  • Defende-se o “ecossocialismo como horizonte de sociedade”
  • Centralidade ao “combate pela erradicação da pobreza e contra o empobrecimento”
  • Valorização de salários e pensões e melhores condições laborais, priorizando a contratação coletiva e as 35 horas de trabalho semanais
  • Serviços públicos robustos e a criação de um “Serviço Nacional de Habitação que promova a oferta pública e cooperativa, combata a mercantilização deste direito e a especulação imobiliária”
  • Descarbonização da economia e a ampliação dos transportes públicos coletivos, como a ferrovia, proibindo "voos comerciais de curta distância", e também a “defesa da biodiversidade e das áreas protegidas”
  • "Levar a cabo a regionalização" e avançar para a “produção descentralizada de energia a partir de fontes limpas”

Guerra na Ucrânia e a União Europeia

MOÇÃO A

  • Critica o regime de Putin que classifica como uma "ditadura oligárquica" que enveredou por uma “aventura belicista”
  • Considera que o Kremlin contribuiu para o reforço da NATO e da estratégia norte-americana de confrontação com a China e subordinação da Europa e projetou o governo autoritário da Turquia como pivô mediador de conflitos entre imperialismos"
  • Reitera o apelo à realização de uma Conferência de paz para a Ucrânia, sob o impulso da ONU e da União Europeia
  • Defende que “a UE deve realizar tratados de não-agressão entre estados europeus”

MOÇÃO E

  • Propõe que o BE se posicione sempre "contra a guerra e avança com o apelo “Putin fora da Ucrânia e a nato fora da Europa”
  • Reconhece a "responsabilidade direta da Federação Russa na invasão da Ucrânia" e afirma não ter dúvidas sobre "o papel agressivo dos EUA e da NATO
  • Exige-se a “todas as potências envolvidas que, em vez de alimentarem a guerra, cessem imediatamente os combates e avancem para negociações de paz”

Adeus, Catarina

Em 14 de fevereiro, Catarina Martins anunciou que ia deixar a liderança do partido, explicando que o que a fez decidir naquele momento "foi pensar que é agora que o Bloco deve começar a preparação da mudança política que já aí está", mostrando-se então tranquila com sucessão porque via no partido pessoas com capacidade e preparação.

Numa entrevista à agência Lusa, a ainda líder - que deixará a coordenação mas fica na Mesa Nacional e na Comissão Política - anunciou que vai deixar o parlamento no final da atual sessão legislativa depois de 14 anos como deputada.

Mariana Mortágua confirmou que seria candidata à sucessão e disse contar com "todas as pessoas que sentem que o Governo da maioria absoluta do PS desistiu e que só atira promessas para cima dos problemas".

A candidata à liderança do BE acusou o partido de António Costa de ter pretendido o "poder absoluto para deixar o país condenado ao desrespeito pela educação e pela saúde, consumido por quem especula com os preços, corroído pela corrupção e pela facilidade milionária dos favores".

No mesmo dia e também na sede do BE, o porta-voz da moção E à convenção, Pedro Soares, estabeleceu o objetivo de parar o caminho de "perda de influência política, social e eleitoral" do partido, através de uma mudança de rumo.