Acidente no Elevador da Glória

Elevador da Glória mudou para cabo com "alma de fibra", o que pode ter feito com que cedesse?

O cabo de fibra terá perdido resistência ao aperto feito ao trambolho ao longo do tempo, devido, por exemplo, às altas temperaturas e à vibração.

Loading...

A mudança do tipo de cabo que suportava o Elevador da Glória pode estar na origem do trágico acidente que matou 16 pessoas. A revelação é feita pelo semanário Expresso, que ouviu vários especialistas.

O cabo, trocado há seis anos, era totalmente em aço. O novo passou a ser "constituído seis cordões de 36 arames de aço com uma alma em fibra". Mudou-se o tipo de cabo mas não a forma como era fixado ao elevador e é esse o motivo que pode ter provocado o acidente.

O cabo terá perdido resistência ao aperto feito ao trambolho ao longo do tempo, devido, por exemplo, às altas temperaturas e à vibração, como explica à SIC Pedro Amaral, professor de departamento de engenharia mecânica do Instituto Superior Técnico.

Nós temos dois materiais, o aço e o polímero, que têm rigidez muito diferente uma da outra (...) à partida no primeiro momento do aperto não constitui um problema, mas depois ao longo do tempo, aquilo que é o material no caso papel polímero vai ter uma cedência. Essa cedência, no lado do polímero é uma cedência plástica, irreversível, e com a temperatura vai deformando”, aponta o especialista. 

Segundo os especialistas ouvidos pelo Expresso, o sistema de amarração deveria ter sido testado pela Carris depois da alteração feita, o que não aconteceu.

Foram ainda identificados problemas com os travões que, sem o cabo, não conseguiam imobilizar as cabinas em movimento. Ou seja, estamos perante um sistema que não era redundante.

Trabalhos de manutenção deviam durar uma hora e duraram 30 e 45 minutos

Para além da inspeção visual no dia do acidente, os técnicos da manutenção também estiveram na noite anterior no Elevador da Glória. O semanário cita o relatório dessa manutenção noturna, que confirma que foi verificado o ponto crítico onde o cabo de ligação entre as duas cabinas se soltou.

Os trabalhos começaram à meia-noite e demoraram 45 minutos. O documento diz que os técnicos verificaram o aperto do cabo, que também foi limpo. O Expresso diz que o cabo também foi lubrificado nos pontos de amarração.

Este trabalho acontece todos os dias. É suposto demorar uma hora. Nessa noite, demorou 45 minutos. Mas na noite anterior demorou apenas meia hora. Não foram identificados problemas em nenhum dos dias. Os especialistas consideram que o tempo dedicado à manutenção foi insuficiente.

Relatório do GPIAAF aponta falhas

O primeiro relatório sobre o acidente foi divulgado no sábado. O documento apresentado pelo Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e Acidentes Ferroviários (GPIAAF) comprova o que já se suspeitava: o cabo que unia as duas cabinas cedeu. Mas acrescenta que o guarda-freios acionou de imediato os travões.

De acordo com o relatório, as cabinas não teriam percorrido mais de seis metros quando perderam "subitamente a força de equilíbrio pelo cabo de ligação que as une".

De imediato, o guarda-freios do veículo "acionou o freio pneumático bem como o freio manual", contudo, as ações "não tiveram efeito em reduzir a velocidade do veículo", que ganhou velocidade e terá sofrido o primeiro embate a cerca de 60 km/h. Estes eventos decorreram em menos de 50 segundos.