Afeganistão

Opinião

Afeganistão. "Há uma sensação de humilhação que dificilmente os americanos vão conseguir ultrapassar"

Germano Almeida analisa a situação em Cabul e a prestação de Joe Biden na gestão da saída militar do Afeganistão.

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Os Estados Unidos decidiram retirar os militares de Cabul, capital do Afeganistão, um dia antes do prazo limite estipulado por Joe Biden. Para Germano Almeida, este “efeito de antecipação” pode ser atribuído ao Presidente norte-americano que “manteve-se fiel ao deadline de 31 de agosto” e até conseguiu antecipá-lo.

"É o fim da mais longa guerra americana de sempre. Já não há forças americanas em Cabul, isso é extremamente significativo e simbólico. O resto terá de ser feito través de uma evacuação diplomática e através do eventual corredor humanitário”, explica o comentador da SIC Notícias.

Para trás terão ficado poucas centenas de americanos que poderão vir a ser retirados depois, caso os talibã cumpram a promessa de deixar sair quem deseja abandonar o país. Essa é uma das principais preocupações e incógnitas neste momento.

“É preciso saber como vai ser feito o tal corredor humanitário, as pessoas que faltam evacuar – americanos, afegãos e outros –, se vão conseguir fazê-lo sem que os talibã vão fechando ainda mais a porta. E, naturalmente, a crise humanitária que se vai seguir, com milhões de refugiados afegãos a fugir da repressão política.

No entanto, Germano Almeida destaca que a operação de retirada foi “a maior ponte da história”, tendo sido possível resgatar 120 mil pessoas em duas semanas. “Em termos gerais esta evacuação, devido à sua dificuldade, tem de ser olhada de forma positiva”, afirma.

Sobre o futuro, há muitas dúvidas que se mantêm. Porém, Germano Almeida destaca a mudança de paradigma que já esta a acontecer no Afeganistão, desde que os talibã tomaram a cidade de Cabul, a 15 de agosto. Depois do atentado de 27 de agosto, reivindicado pelo Daesh-K, o comentador avança que o papel dos talibã mudou:

A única força que pode dar alguma estabilidade ao Afeganistão são os talibã, porque podem conter essa força terrorista. São os únicos que podem assegurar minimamente um processo total de evacuação. E têm que conseguir fazer aquilo que não fizeram há duas décadas, que é libertar-se da ligação à Al-Qaeda”, diz sublinhando que já existem rumores da possibilidade de regresso de elementos ligados ao grupo terrorista.

► O momento de viragem para Joe Biden

Germano Almeida considera que a decisão de retirar as tropas norte-americanas do Afeganistão constitui um ponto de viragem na Presidência de Joe Biden. Nos primeiros sete meses, a popularidade do Presidente estava em alta, no entanto a gestão da retirada das tropas surge como uma mancha.

“Biden vai ter de reformular esse seu “America is back” [América está de volta] depois da forma muito negativa como saiu desta situação. Há um sensação de humilhação que dificilmente os americanos vão conseguir ultrapassar rapidamente. Houve também a crise na relação com os europeus pela questão do deadline de 31 de agosto”, explica o comentador.

O comentador reforça que o responsável por esta situação é Joe Biden e que o Presidente poderia ter feito a transição de forma mais suave e progressiva. Por outro lado, destaca também que Biden foi o único Presidente a concretizar a decisão de retirar as tropas do Afeganistão, que já tinha sido tomada há duas administrações atrás.

“A saída americana do Afeganistão era uma decisão política bipartidária das últimas três administrações, estava tomada há anos. E a Biden, que não soube garantir uma saída ordenada, devemos, pelo menos, dar-lhe o crédito de ter coragem de assumir essa saída e não ter querido passar para o próximo Presidente, que foi o que fizeram os anteriores presidentes.”

Germano Almeida considera ainda esta “foi uma das maiores derrotas da história americana das últimas décadas” e que “a gestão política vai ter de ser feita por Biden”. Avança que também a NATO deverá ser repensada depois do que se passou no Afeganistão.

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