Dois dos 11 arguidos envolvidos da Operação Miríade ficam em prisão preventiva, decidiu o juiz Carlos Alexandre. As medidas de coação foram conhecidas esta quarta-feira, resultando também na aplicação da suspensão do exercício da profissão a quatro arguidos, proibição de contacto e de se ausentar do país e outros oito arguidos e ainda apresentações periódicas para nove dos 11 arguidos, sem especificar os nomes a quem foram atribuídas as respetivas medidas.

O anúncio das medidas de coação surgiu ao fim de quase cinco horas de diligência no Campus da Justiça, que deram continuidade ao interrogatório dos arguidos iniciado na tarde de terça-feira. Dos 11 arguidos, apenas cinco decidiram prestar declarações perante o juiz Carlos Alexandre.
O alegado líder da rede criminosa, Paulo Nazaré, será um dos dois arguidos a ficar em prisão preventiva, revelou fonte ligada ao processo. Segundo a mesma fonte, o outro arguido a receber a medida de coação mais gravosa será o alegado braço-direito do cabecilha da rede criminosa, Wilkar Almeida.
Operação Miríade: militares traficavam diamantes nas missões da ONU
A Polícia Judiciária (PJ) executou, a 8 de novembro, 100 mandados de busca e fez 11 detenções, incluindo militares, um advogado, um agente da PSP e um guarda da GNR, no âmbito da Operação Miríade, num inquérito dirigido pelo Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa.
Em causa está a investigação a uma rede criminosa com ligações internacionais que "se dedica a obter proveitos ilícitos através de contrabando de diamantes e ouro, tráfico de estupefacientes, contrafação e passagem de moeda falsa, acessos ilegítimos e burlas informáticas", com vista ao branqueamento de capitais.
Em comunicado, o Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMGFA) revelou que alguns militares portugueses em missões da ONU na República Centro-Africana podem ter sido utilizados como "correios no tráfego de diamantes", adiantando que o caso foi reportado em dezembro de 2019.
QUEM DENUNCIOU O ESQUEMA?
O esquema terá sido denunciado por duas pessoas: um tradutor da missão das Nações Unidas, natural da RCA, que terá revelado o caso como retaliação, depois de não receber um pagamento de cinco mil euros que havia sido prometido por militares portugueses em troca da colaboração no negócio de diamantes.

Depois, por um major a quem terá sido entregue uma encomenda, supostamente com peças de artesanato, para serem enviadas para Portugal em voos militares. Ao abrir a caixa, o major percebeu que se tratavam de oito diamantes: três em bruto, cujo valor bruto andaria à volta de 80 mil euros, e cinco já lapidados, avaliados em pouco mais de seis mil euros.
Sem hesitar, denunciou o caso a Vítor Gomes, o comandante da 6.ª força nacional destacada de paraquedistas, que reportou o caso ao Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas. Poucos dias depois, o ministro da Defesa, o Ministério Público e a Polícia Judiciária também já tinham conhecimento do caso.
REDE INTERNACIONAL DA QUAL FAZIAM PARTE EMPRESAS E ADVOGADOS
De acordo com o despacho de indiciação, a que a SIC teve acesso, a rede de tráfico incluía até 40 empresas e outras 66 pessoas, duas das quais advogados.
Os 11 detidos na Operação Miríade são suspeitos de contrabando de diamantes, ouro e droga, que transportavam em voos da ONU, com destino a Antuérpia, na Bélgica, a capital mundial dos diamantes, onde seriam vendidos a preços milionários.
Marcelo condecorou Comandos já a investigação decorria
Em junho de 2020, acompanhado pelo ministro da Defesa, o Presidente da República condecorou o Regimento de Comandos, atribuindo-lhe a Ordem da Liberdade e sublinhando o papel nas missões internacionais do Afeganistão à República Centro-Africana (RCA).
Nessa altura, decorria já a investigação aos militares portugueses, por suspeitas de tráfico de diamantes nas missões da ONU na RCA e da qual o ministro da Defesa estava informado. Marcelo não sabia, já que o caso estava sob sigilo.

Mesmo sendo Comandante Supremo das Forças Armadas, a separação de poderes - judicial do político - pode ajudar a compreender por que o Presidente da República não tenha sido informado.
ESPECIAL OPERAÇÃO MIRÍADE
VEJA MAIS:
-
Operação Miríade: esquema terá sido denunciado por intérprete e por um major
- Operação Miríade: "Poderemos estar perante um crime internacional"
- Operação Miríade: seis dos 11 arguidos não quiseram responder ao juiz
- Operação Miríade: PSD e PCP alertam que caso tem impacto na imagem das Forças Armadas
- Tráfico nas missões militares portuguesas: "Não podemos confundir a árvore com a floresta"