Marcelo Rebelo de Sousa deixou, esta terça-feira, recados ao Governo sobre a responsabilidade de ter maioria absoluta. O Presidente da República focou-se em exemplos do passado para desafiar o primeiro-ministro a chegar ao final da legislatura com uma maioria absoluta “não apenas de nome, mas de obra”.
“A história demonstrou que tivemos experiências de vários tipos de maiorias absolutas. Tivemos uma maioria de nome e obra e uma maioria que, a partir de certa altura, era só de nome. Porque se esvaziaram, porque se cansaram, porque se descolaram do país”, começa Marcelo.
Para a atual maioria absoluta, o Chefe de Estado afirma que é preciso é que o Executivo “utilize os fundos e que possa ser motor de uma recuperação económica que tire proveito dos números de 2022 e projete para o futuro”.
“Os portugueses, quando escolheram uma maioria absoluta, não escolheram por acaso”, sublinhou Marcelo, lembrando o que disse no dia da tomada de posse do Executivo: “Maioria absoluta não é poder absoluto, é responsabilidade absoluta”. Afirma ainda que a decisão dos portugueses foi tomada para que o Governo não tivesse "álibis para não fazer o que é preciso fazer”.
Quando questionado sobre a entrevista a António Costa, emitida esta segunda-feira, o Presidente da República recusou-se a comentar a intervenção. No entanto, considerou declaração do primeiro-ministro, de que Governo “pôs-se a jeito”, como uma “expressão curiosa”.
“A função do Presidente da República é ajudar o Governo a não se por a jeito, a que a maioria absoluta de nome deixe ser uma maioria absoluta de obra também”, afirma.
Marcelo frisou que o país vai receber um valor elevado de apoios europeus, voltando a alertar o Governo para que os utilize nos investimentos que têm de ser feitos, nomeadamente na Saúde, Educação, Segurança Social, Obras Públicas, Infraestruturas. Anteriormente, o Presidente já tinha alertado a ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa, que não lhe perdoaria se o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) não fosse executado na totalidade.
A decisão do Constitucional sobre eutanásia
Marcelo Rebelo de Sousa destacou que os juízes do Tribunal Constitucional (TC) deram “razão a um dos três fundamentos” que o Presidente tinha justificado quando envio o diploma para o Palácio Ratton. Afirma que o acórdão deverá chegar esta terça ou quarta-feira a Belém, sendo “imediatamente” enviado para a Assembleia da República, que “apreciará a fundamentação do TC”.
“Eu não comento as decisões do tribunal. A minha função é, havendo dúvidas de certeza e segurança, eu levanto a questão. Uma vezes o tribunal dá razão, outras não”, disse Marcelo.
No entanto, o Presidente destacou que o Constitucional “tem feito um esforço grande para facilitar a tarefa da Assembleia da República” ao explicar, em cada acórdão, “qual o caminho que se deve seguir”. Sobre a realização de um referendo ao tema, Marcelo lembrou que o assunto já foi chumbado no Parlamento.
“A Assembleia da República recusou já uma vez o referendo e não o apreciou da outra vez. É uma decisão que já tomou, está tomada. O que podemos dizer é que tem havido um diálogo institucional muito rico ao longo dos cinco anos e que o TC, das duas vezes em que foi chamado a intervir, não se limitou a considerar inconstitucional um ou outro ponto do diploma, mas abriu caminhos para a solução”, disse o Chefe de Estado, sublinhando que o diálogo tem ocorrido “sem dramas, sem crispações” e sem um “dramatizar” do assunto.
Marcelo aproveitou para anunciar que irá enviar para o TC o diploma que regula as Ordens Profissionais, aprovado esta quinta-feira pelo Parlamento. Este diploma altera as condições de acesso a algumas profissões, introduz estágios remunerados e cria uma entidade externa para fiscalizar os profissionais.
“O TC é soberano e se o TC entende que determinados fundamentos apresentados pelo Presidente da República não têm cabimento, o Presidente da República aceita. Admito nos próximos dias pedir novamente ao TC que se pronuncie em fiscalização preventiva sobre outro diploma porque penso que é bom que haja certeza e segurança dos portugueses", afirma Marcelo, acrescentando tratar-se do diploma que regula as Ordens Profissionais.
Polémica e demissões
Quando questionado sobre a demissão de Luísa Sá Gomes, subdiretora-geral da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária – a mais recente polémica envolvendo membros do Governo – Marcelo decidiu focar-se no “escrutínio” que está a ser feito ao Executivo. Para o Presidente, é “sinal de uma democracia forte”.
“Nas democracias de hoje o escrutínio é muito apertado”, afirma Marcelo. “É bom, é sinal que a democracia portuguesa está mais forte, não está mais fraca. Haver a capacidade de controlar e, em função desse controlo, haver respostas que correspondam a padrões de exigência crescente dos portugueses. Quer dizer que os portugueses estão muito mais exigentes”, afirmou Marcelo.
Em relação ao bónus de dois milhões de euros que poderá ser atribuído à CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener, o Chefe de Estado considera que esta questão deverá ser “ponderado no quadro do que está em debate sobre o futuro da TAP”, lembrando que serão constituídas comissões de inquérito e está em curso uma investigação da Inspeção-Geral das Finanças.
“Eu acho que é nesse quarto que deve ser examinado, em primeira linha pelo Parlamento, o que é importante para os portugueses: que a TAP dê a volta, que passe de perder para ganhar dinheiro – uma vez que é dinheiro dos portugueses que se perde ou que se recupera parcialmente – que seja definido pelo Governo se deve ser privatizada e que termos deve ser privatizada”, afirma.